Reportagem Overkill no Porto
Flotsam & Jetsam
Rezet
No que foi uma grande sessão de pura nostalgia, três nomes de peso do universo do thrash metal - Overkill, Destruction e Flotsam and Jetsam, acompanhados ainda pelos Rezet – juntaram-se para proporcionar uma emotiva viagem aos anos 80, a esse período áureo não só para o thrash, como para o metal em geral, em que parecia que praticamente todos os dias era lançado um clássico incontornável que mudava para sempre a história do género. Longe vai essa época, é certo, mas a verdade é que neste belo serão pudemos regressar espiritualmente a esses tempos que tantos recordam com saudade, quase como se uma máquina do tempo tivesse sido instalada no Hard Club e levado os presentes de volta a um passado que hoje só existe nas memórias de quem o experienciou; de tão genuína que a atmosfera na Sala 1 era, quem sabe se não foi isso que realmente aconteceu?
Olhando para a audiência, notava-se a presença de algum público jovem, o que prova – e ainda bem - que estas bandas conseguem agradar às novas gerações, mas mais visível foi a adesão de pessoal da velha guarda, dos que se aventuraram pelo mundo das sonoridades pesadas na adolescência e que vieram precisamente aqui relembra-la, aproveitando para passar um bom bocado com velhos amigos- bastava, aliás, andar pelo Mainfloor do Hard Club, ou mesmo pela sala durante os intervalos das atuações, para nos apercebemos do saudável clima de convívio que aqui se vivia.
Felizmente, não só de reencontro com conhecidos se fez esta noite, pois os concertos também se revelaram, na sua maioria, memoráveis. Se os Flotsam and Jetsam foram competentes sem, no entanto, conseguirem disfarçar óbvios sinais de cansaço, sobretudo por parte do vocalista Eric “A.K” Knutson (ao contrário dos germânicos Rezet, deveras enérgicos),dos Destruction e Overkill só boas coisas há a dizer.
Os primeiros, verdadeiros líderes do movimento thrash alemão ao lado dos Kreator e Sodom, provaram ser ainda capazes de proporcionar uma bela e valiosa lição na arte de tocar bom metal. Independentemente do que se ache do som praticado pelo grupo germânico, é praticamente impossível não respeitarmos, e admirarmos, tal demonstração de vitalidade e paixão, sobretudo quando os anos de estrada já são muitos. Nesta atuação relativamente curta mas inegavelmente poderosa, escutaram-se novidades como “Betrayal “ misturadas com“eternos” clássicos como “The Butcher Strikes Back” ou, a fechar com chave de ouro, “Bestial Invasion”.
A nostalgia foi, aqui, a palavra-chave- os Destruction fizeram até questão de enfatizar esse sentimento ao recordar a primeira passagem por Portugal, corria o ano de 1988, numa “daquelas” noites que atingem um fascinante estatuto mítico ( neste caso, num concerto com os lendários Motörhead, ainda por cima) -, mas independentemente das memórias que os tempos áureos evocam, a banda mostrou estar em forma, encontrando-se sempre pronta para uma valente descarga de thrash rápido, intenso e demolidor. Assim sabe bem ver grupos veteranos!
Podia estar aqui o melhor concerto, mas não, os Overkill rapidamente trataram de “roubar” esse título através de uma prestação apaixonada, dinâmica e cheia de bom humor- outra coisa não se esperava, pelo menos para quem já tinha anteriormente testemunhado concertos do grupo de New Jersey, desde a inspirada atuação no Vagos Open Air há quatro anos até à saudosa passagem pelo “ velhinho” Hard Club. Mesmo para quem não seja fã da banda, a genuína intensidade que caracteriza os concertos do coletivo é deliciosamente contagiante, podendo ser vista como uma espécie de tentativa em provar que a idade é só um mero número e que o mais importante será sempre o espirito e a atitude- e dessas qualidades os Overkill não estão em falta. Na verdade, será justo afirmar que possuem mais energia que muitos outros grupos contemporâneos, e será igualmente justo supor que isso é o resultado de uma inesgotável paixão por aquilo que fazem- amor à camisola, como se costuma dizer. O carismático vocalista Bobby “Blitz” Ellsworth chegou mesmo a contar, a certa altura, a história de como a mãe lhe aconselhou a encontrar algo que quisesse seguir e, posteriormente, a reunir pessoas para concretizar esse sonho – e pode-se mesmo afirmar que o homem não desobedeceu à mulher que lhe deu a vida.
E por falar nessa tão marcante figura que é o frontman dos Overkill, há que destacar o estado impecável da voz do homem, ainda praticamente tão potente como aquela que conhecemos em seminais lançamentos como The Years of Decay. Impressionante, sem dúvida, mas parece que o surreal, no universo deste grupo, constitui o normal- afinal, se não fossem pequenos pormenores como os cabelos brancos de Bobby, podíamos esquecer temporariamente que o ano era 2019 e achar que estávamos a assistir a uma prestação de 1989- difícil de acreditar, só mesmo para quem não lá esteve.
O som podia ter estado melhor, é um facto (algo que se notou ao longo da noite toda), mas isso, assim como o calor da sala, acabaram por ser realmente os grandes defeitos deste serão, já que de resto nada temos a apontar. Entre temas mais recentes (incluindo do potente novo álbum que é The Wings of War) e clássicos como “Elimination”, “ Feel the Fire”, “Rotten to the Core” ou a cover de “Fuck You” dos Subhumans, celebramos com os Overkill, e eles connosco. Que noite esta…
-
segunda-feira, 23 setembro 2019