Reportagem Acid Mothers Temple no Porto
Uma terça-feira pode não parecer o melhor dia para a existência de um evento deste calibre. Ainda para mais com um tempo duvidoso, de chuva e o glorioso na TV. No entanto, estas adversidades não foram relevantes o suficiente para afectar a noite. Noite esta que iria ser bem gloriosa e que certamente muita gente irá relembrar.
No fundo, prometia-se o regresso ao Hardclub de duas grandes entidades musicais. Com a agenda preenchida, seria a sala 2 a escolhida para palco desta noite: de um lado os nipônicos Acid Mothers Temple, que tiveram presença marcada no mesmo espaço, no primeiro Amplifest de sempre e que certamente não deixaram ninguém indiferente; do outro, os eternos rockers americanos, os incansáveis Valient Thorr com o seu mítico barrigudo Valient Himself.
Para iniciar a noite tínhamos os barcelenses Aspen, que como o cartaz indicava traziam consigo o Holy Mountain dos Sleep e do Jodorowsky (na tela de projecção).
Com a sala ainda muito vazia, iniciou-se uma longa caminhada à montanha sagrada. E não será estranho dizer que à medida que os riffs lentos e duros abraçavam e ao mesmo tempo esmagavam a sala, apareciam mais e mais seguidores dispostos a ouvir os Aspen a interpretar este mítico álbum. Serviu como uma boa homenagem e grande começo de noite que iria melhorar mais para a frente.
A entrada dos Valient Thorr foi realmente valente, com o Valient o próprio, a entrar envergando uma capa verde com o seu símbolo já tão característico. Momentos depois ouviam-se os primeiros acordes de "Double Crossed" que se encarregou de pôr o público a delirar instantaneamente.
Todos aqueles que estavam familiarizados com a sonoridade dos Thorr e inclusive tiveram presentes nesta mesma sala há um ano atrás, já sabiam o que esperar: uma descarga fenomenal de rock n’ roll à antiga, suado, puro e duro.
Também os Thorr fizeram uso da tela e passaram filmes americanos futuristas, onde as personagens andavam de motas e disparavam lasers. Tudo isto para apimentar a envolvência e o grande ambiente que se sentia na sala já muito aquecida.
Tendo lançado ainda este ano o novo Our Own Masters, era natural que uma parte da setlist fosse recair nas músicas do mesmo, onde os Valient Thorr continuam a mostrar que ainda são fiéis a eles próprios. Acentes fortemente em questões sociais e políticas do nosso mundo, ouviram-se "Immaculate Consumption" a alertar para o excessivo consumismo nas nossas vidas, "Master Collider" a relembrar nos da fragilidade do nosso planeta e nós próprios perante um universo hostil, ou "Torn Apart" que pôs o público a cantar o refrão em uníssono.
Como era óbvio, não se podiam deixar de lado as já clássicas "Exit Strategy Heatseeker", "Sleeper Awakes" e "Tough Customer".
Porém a noite ainda não tinha acabado, e depois de um intervalo para acalmar os ânimos faltavam actuar os Acid Mothers Temple. Os mestres nipônicos estavam cá para nos proporcionar o que seria uma viagem ao passado, tocando o Paranoid dos Black Sabbath. Tarefa árdua, com certeza, mas não para estes senhores que não desiludiram, nem de longe.
Abrindo logo com um enorme clássico, facilmente reconhecível pela batida inicial, ouve-se "Iron Man", a dar o mote para uma eterna viagem de psicadelismo, fundindo os universos de ambas as bandas.
Embora a voz do Tabata Mitsuru tentasse soar parecida com a de Ozzy Osbourne por meios de reverb e mais reverb, dificilmente o conseguiria. Mas sejamos francos, ninguém esperava tal coisa. O que não destoou de todo uma actuação simplesmente brutal, onde os intermináveis solos, cheios de alma de Kawabata Makoto conduziam a banda a velocidades estonteantes. De notar a excelência e perícia de todos os membros integrantes, é gratificante ver tal entrega e sinceridade.
Não faltou também "The Wizard" tirada do homônimo dos Black Sabbath com a mítica harmônica soando através dos lábios do mestre Higashi Hiroshi, e deliciando os presentes.
E nada seria completo sem um final em grande e à moda antiga, onde a guitarra não sobrevive para contar a história, mas todos aqueles que presenciaram a despedida da Fender de Makoto saberão para sempre o que ali aconteceu.
Em suma uma grande noite deste mês de Novembro que ainda mal começou.
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sábado, 20 dezembro 2014