Reportagem Alt-J em Lisboa
O tempo é efémero. Parece que foi ontem que se celebrava a transição de 2017 para 2018, mas a brincar, o novo ano já conta com uma semana de existência. Dando continuidade a esta coisa do tempo ser algo de fugaz, é estranho pensar que a estreia dos alt-J em Portugal remonta ao ano de 2012, numa tímida aparição pelo Milhões de Festa, no Verão, seguido por regresso mais aplaudido já no final desse mesmo ano, no Vodafone Mexefest. Desde então, as visitas do tripleto constituído por Joe Newman, Thom Sonny Green e Gus Unger-Hamilton tornaram-se bianuais e sempre no festival NOS Alive, isto desde 2013 até 2017.
Foi no passado dia 6 de Janeiro, Dia de Reis, que a Altice Arena inaugurou a sua vasta agenda de concertos para 2018 com a estreia dos alt-J em nome próprio em Portugal, e logo pela porta maior das salas de espetáculos no nosso país. Desde 2012 que a banda de Leeds veio fomentando uma relação amorosa para com o público português, tornando-se num dos maiores fenômenos do indie rock britânico nos últimos tempos por terras lusitanas.
Para a ocasião, que seria o primeiro concerto da segunda tournée de divulgação do mais recente disco Relaxer, a Altice Arena apenas usou meia sala e uma das suas duas bancadas, isto numa tentativa de iludir à impressão de uma casa cheia. Mesmo com a afluência a não ser a esperada, aquela que se reuniu era deveras heterogénea, vendo-se pessoas de todas as idades, contrariando a hegemonia jovem que seria expectável.
Encarregue da primeira parte do concerto, Marika Hackman tinha a ingrata tarefa de entreter um público que em tudo não era o seu, com uma reduzida percentagem da Altice Arena a ser conhecedora na carreira da britânica. Ainda assim, e com dois álbuns na bagagem, Marika mostrou o melhor do seu ainda recente percurso para entreter os ansiosos fãs de alt-J, embora muitos fossem aqueles que preferiam matar o tempo pelos nos seus telemóveis ou a comprar merchandise da banda noite. Infelizmente, lá para o final da noite, poucos seriam aqueles que tinham ficado com o concerto de Marika Hackman na memória.
Poucos minutos da hora marcada, as luzes da Altice Arena apagam-se para finalmente receber os alt-J sob uma enorme chuva de palmas e gritos de histeria, tudo enquanto se começava a desenrolar um hipnotizante jogo de luzes que os acompanharia ao longo de todos o concerto. Trocando as voltas de quem já os tinha visto no NOS Alive o ano passado, a banda opta por iniciar a noite ao som de “Pleader”, tema término de Relaxer, em que a conjunção entre teclas celestiais, cordas acústicas e bateria imperial, sustêm de base para os rasgões vocais característicos do timbre de Newman, levando meia sala a tentar captar o momento com os seus telemóveis.
Pouco depois, seguiram-se “Fitzpleasure” e “Nara”, dois polos opostos – tema eletrizante e uma balada, respetivamente – e que tão bem demonstram que os alt-J são, acima de tudo, uma banda versátil na composição de temas; de realçar a forma como a acústica da Altice Arena jogou a favor da banda. “Something Good”, “The Gospel of John Hurt” e a muito aplaudida “In Cold Blood” foram os temas que seguiram, sendo fascinante a forma como o jogo de luzes e de vídeo do espetáculo tinham uma relação simbiótica para com as notas ou batidas lançadas pela banda, estando em completa sintonia que se tornava num luxo para os nossos olhos.
Dita o Teorema de Pitágoras que, num triângulo retângulo, o quadrado do comprimento da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos comprimentos dos catetos. Apesar de a banda proclamar que os triângulos são as suas formas favoritas, como na celebrada “Tesselate”, esta analogia provém da forma como a soma de This is All Yours e Relaxer no repertório é igual à quantidade de temas do premiado An Awesome Wave que foram tocadas. Mesmo sendo uma tournée em prol do terceiro de disco de originais, verdade seja dita que foi sobre o primeiro que grande parte do concerto se foi desenrolando através de, sendo este praticamente tocado na íntegra.
Face a esta decisão de apostar fortemente em An Awesome Wave, fica-nos na cabeça a imagem de que os alt-J se tornaram numa banda presa ao passado, a viver na sombra do sucesso de um disco cujos seus sucessores nunca conseguiram superar. Todavia, temas como “Hunger of The Pine”, “Left Hand Free” e “Deadcrush” rapidamente dissipam-nos dessa ideia, sendo exemplos perfeitos da versatilidade e originalidade da banda que sempre tentou ir mais além na sua sonoridade, mas sem nunca perder a sua identidade pelo meio. Apesar de a aposta forte no disco que gerou “Matilda”, que será sempre o crowd-pleaser do costume – que bonito foi ver toda a Altice Arena a cantar “This is from Matilda” em uníssono – ou de “Taro”, a obrigar a que se levante os dedos em formato de triângulos no ar, esperava-se um alinhamento mais equilibrado.
Os alt-J nunca foram e provavelmente nunca serão uma banda digna do título ‘animais de palco’ – estáticos do início ao fim e pouco interativos com o público, com a exceção das saudações da praxe – mas conseguem ter o público na sua mão, que é seu do início ao fim: dançante em “Dissolve Me”, coordenado nas palmas em “Fitzpleasure” e barulhento em “Every Other Freakle”, não foi preciso muito para ver que a relação amorosa entre os alt-J e os portugueses é para durar.
Para o encore, “3WW” abre as hostilidades daquela que é a mais recente sinfonia eletrizante da banda, com Joe Newman a substituir na perfeição o excerto doce cantado por Ellie Rowsell dos Wolf Alice, embora o grande momento estaria reservado para o fim com “Breezeblocks”, levando os efeitos luminosos da sala para toda outra dimensão e a recolher cantorias por parte do público de forma sensacional, com os “Please don’t go” finais quase a simbolizar um pedido para que aquela hora e vinte de concerto se prolongasse por mais algum tempo.
Numa sala que fugia do ambiente intimista a que uma atuação de alt-J se exige, mas única na capacidade de levar a cabo o belo jogo de luzes da banda, o tripleto de Leeds levou a cabo um espetáculo que se consagraria como o derradeiro concerto dos alt-J em Portugal, num concerto que certamente encheu as medidas de todos os seus fãs. Apesar do risco em trazê-los a uma sala de magnitude tão elevada como a da Altice Arena, a verdade é que a banda singrou e passou no teste. Cá estaremos à espera do quarto disco.
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Organização:Everything is New
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segunda-feira, 08 janeiro 2018