Reportagem Amplifest Session Solidária
A música, mais do que uma simples forma de expressão artística, pode igualmente ser usada para tornar o mundo num lugar um pouco melhor; foi esse o objectivo desta Amplifest session, cujas receitas reverteram para as causas promovidas pela Renascer – uma instituição de solidariedade que tem como objectivos a luta contra a exclusão social e a desigualdade de oportunidades. Esta noite serviu também como aquecimento para o fim-de-semana do Amplifest, em Agosto, e teve como principais atracções os regressos de Aaron Turner com Mamiffer e SUMAC e de Mark kozelek com o conhecido projecto Sun Kil Moon.
Foi precisamente com Mamiffer que a maratona de concertos se iniciou. O grupo, onde Aaron Turner (Isis, Old Man Gloom) se junta à sua mulher Faith Coloccia (tendo estado também em palco Brian Cook dos Russian Circles), protagonizou um concerto que só pode ser descrito como belo e transcendente. Desde a beleza de cariz eclesiástico dos teclados em perfeita comunhão com as guitarras sufocantes, numa espécie de representação sonora de uma batalha entre o paraíso e o inferno, passando por momentos de pura intensidade noise, os Mamiffer ofereceram uma panóplia de emoções, indo do mais negro e assustador até ao mais puro estado de poesia musical. Um concerto inspirador por parte de um projecto simplesmente maravilhoso. Destaque ainda para a compreensão do público que, a pedido da Amplificasom e da banda, não fumou durante o evento devido à gravidez de Faith.
Aaron Turner regressou posteriormente com os SUMAC, supergrupo do underground que inclui o já mencionado Brian Cook e ainda Nick Yacyshyn dos Baptists. Naquele que foi um concerto poderoso e devastador, houve também espaço para a dissonância e a experimentação. No fundo, proporcionaram ao seu público – que constituía uma parte significativa da audiência - exactamente o que deles era desejado: uma perversa descarga de post-metal, doom e noise, numa actuação onde a entrega de Aaron foi notável e onde se sentia bem a felicidade dos presentes, deliciados com os riffs demolidores, o registo vocal cavernoso e a esmagadora parede de som.
Precisamente a meio tivemos mais uma visita do senhor Mark Kozelek como Sun Kil Moon, acompanhado por Steve Shelley (Sonic Youth) e Ben Boye. Por muito talentoso que Kozelek seja – e não haja dúvidas quanto a isso – estava aqui um pouco como um “outsider”, tendo caído de paraquedas num evento onde a sua presença foi apreciada por uns e incompreendida por outros que estavam mais interessados em esperar que os SUMAC subissem ao palco. Todavia, esse clima até originou um ambiente único, com o músico norte-americano a revelar o seu lado divertido e relaxado. Brincou com o facto de ser a primeira vez que actuava antes de uma banda de metal, dedicou uma cover de “ Something Stupid” (tornada famosa por Frank Sinatra e a sua filha Nancy) a uma pessoa que supostamente se encontrava quase a dormir e, já durante o encore, ouvimos “Over the Rainbow” (versão inspirada na música originalmente cantada pela actriz Judy Garland), que Kozelek diz ser estranhamente a canção favorita do pai. Pelo meio, ainda tivemos direito a músicas como “the Possum”, “Dogs”, faixas retiradas da recente colaboração com Justin k. Broadrick e a emblemática “Richard Ramirez Died Today of Natural Causes”.
Para quem o queria ver, Mark Kozelek voltou a encantar no seu papel de músico que também é um contador de histórias. Para os restantes, a sua actuação representou o momento perfeito para descansar antes da tareia sonora de SUMAC. Seja como for, será seguro afirmar que todos saíram da sala com uma opinião bem formada sobre aquilo que testemunharam; nesse sentido, o ex- Red House Painters deixou a sua marca esta noite.
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sexta-feira, 22 novembro 2024