Reportagem Bill Callahan no Porto
Foi uma noite especial a que se viveu na Casa da Música no passado domingo. O motivo? O regresso de Bill Callahan, um dos mais prolíferos e criativos cantautores das últimas duas décadas.
O músico norte-americano goza de um estatuto lendário há já algum tempo, e a sala praticamente cheia que o recebeu é prova disso mesmo. Mas o que torna Callahan num artista tão respeitado e admirado? Será a sua voz possante, que tanto provoca arrepios como tranquiliza a alma? Ou será o minimalismo da sua música, que quando devidamente apreciada nos faz viajar por mundos mais agradáveis do que aquele onde vivemos? Na verdade, é isto e muito mais. Sentimo-nos bem a ouvir a música deste senhor, até porque a mesma tem-se tornado mais serena com o passar dos anos – basta observar o modo como Callahan descreve o mais recente “Dream River”: um álbum para ser escutado à noite de forma a terminar um longo dia num estado de espírito relaxado e absolutamente perfeito. Pois bem, seguindo essa linha de raciocínio, nada melhor para descomprimir e “mimar” a alma do que ouvir essas canções – assim como clássicos do passado – num belo serão proporcionado pelo próprio artista.
No entanto, para além da componente emocional, o fascínio por Bill Callahan prende-se igualmente com o óbvio talento do mesmo, já para não falar no carisma. Quando Callahan fala, o público ouve com atenção e prazer. È precisamente essa adoração que origina uma ovação de alto nível como a que ouvimos logo de início, mal este pisou o palco da Sala Suggia. Perante uma recepção digna de estrela de rock, o músico permaneceu humilde e profissional, pois atitudes de estrela não é com ele, não representam o que quer ser e revelam-se desnecessárias no âmbito de um espectáculo intimista. A missão era tocar para as pessoas que pagaram para o ver e o objectivo foi cumprido. Mas se Bill é, obviamente, o centro das atenções – ao ponto de ser o único a tocar de pé – a banda que o acompanha é exemplar no que faz. Destaque para o baterista Adam Jones – preciso na maneira como utiliza as baquetas – e o guitarrista Matt Kinsey – especialista em enfeitar delicadamente as melodias base das músicas, através de feedback ou reverb. Tudo isto envolto em composições simples, de uma simplicidade genial, alias, e que se fossem mais complexas, talvez perdessem algum do charme que possuem.
Este foi um concerto para ser sentido – até podíamos fechar os olhos ou concentrarmo-nos nas imagens projectadas na tela ao fundo do palco, que continuaria a ser uma viagem indescritivelmente maravilhosa. Claro que a qualidade desta prestação deveu-se também ao bom anfitrião que Callahan consegue ser: a certa altura, fez questão de elogiar a gastronomia nacional ("Another dinner of bacalhau, the saltiest of fish, quite delicious…”), e como se a boa educação e a banda sonora de luxo não fossem suficientes, tivemos direito a uma longa actuação com um óptimo setlist, sobretudo na contagem final: "Seagull", "Dress Sexy at My Funeral" e "Winter Road”. E assim terminou o concerto… Pensávamos nós, pois ainda houve encore com “ Rock Bottom Riser”, que fechou este regresso com chave de ouro.
Na primeira parte, tivemos a apresentação de Circuit des yeux, alter-ego de Hayley Fohr, jovem norte-americana de 24 anos. Se as actuações de abertura são por vezes ignoradas, esta não merecia receber tal tratamento; felizmente isso não aconteceu. Com uma voz sofrida a acompanhar emotivas melodias de guitarra – ora com som limpo, ora repletas de distorção – este concerto foi memorável e fez-nos ficar com pena de ser apenas um aquecimento para o que viria a seguir.
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sábado, 20 dezembro 2014