Reportagem Cigarettes After Sex no Porto
Os Cigarettes After Sex tornaram-se nos últimos anos num fenómeno de popularidade, no que pode ser visto como um curioso resultado da era de promoção artística via Internet. O hype em torno do projecto liderado por Greg Gonzalez é de tal forma elevado que o anúncio do seu regresso em nome próprio, um dia depois de marcarem presença no Vodafone Mexefest, levou a que o Hard Club tenha esgotado com mais de um mês de antecedência, sendo que somente cinco meses tinham passado desde a actuação do grupo no âmbito do festival Nos Primavera Sound. Todavia, em casos destes, o intervalo entre passagens é completamente irrelevante, pois a (cada vez mais) vasta legião de fãs da banda está sempre pronta para os receber de forma calorosa.
Sucessos tão repentinos suscitam sempre reacções extremas, sendo que os Cigarettes After Sex têm dividido opiniões ao longo da sua ascensão meteórica. Contudo, nesta noite de domingo particularmente fria, eram já longas as filas que se formavam no corredor central do Hard Club quando ainda muito tempo faltava para a abertura de portas e, acima de tudo, o início do espectáculo.
Contudo, se a espera foi longa, a chegada foi um momento triunfal: mal o quarteto subiu ao palco, ao som de “Sunsetz”, perdemo-nos na melancolia romântica que caracteriza as suas músicas. Pegando na fórmula de bandas como Mazzy Star ou Red House Painters, constroem delicadas e encantadoras peças de dream pop com referências shoegaze, numa sonoridade que vive de contrastes emocionais: a leve tristeza que se segue à mais pura felicidade, essa saudade pela perfeição efémera de um momento no passado ao qual não podemos regressar. Contemplativos sem serem depressivos, doces com uma pequena dose de amargura, os Cigarettes After Sex escreveram poesia não só através das palavras suavemente cantadas por um afável mas reservado Greg Gonzalez, mas também através do som e da imagem. Servindo-se de projecções minimalistas mas sedutoras que enfatizaram a sua componente cinematográfica, desde sempre presente num universo pintado, tal como um filme antigo, a preto e branco, o grupo teve na sala escura e intimista do Hard Club o local ideal para esta sessão musical introspectiva. Colocá-los, na altura do Primavera, durante a tarde foi um erro; todavia, aqui o cenário adequou-se ao ambiente criado pelas músicas. Canções como “K”, “Sweet” ou “John Wayne” soaram bastante bem neste contexto de maior proximidade emocional, mas talvez seja por isso que ouvir estas composições ao vivo nunca ultrapasse realmente a magia de escutá-las em disco.
A actuação, como já referimos com pormenor ao longo do texto, foi deveras interessante. No entanto, a atmosfera vulnerável e sensível que o colectivo instala é de tal forma soberba quando a exploramos no conforto do nosso lar, ali num cantinho só nosso onde podemos mergulhar livremente neste majestoso romance sonoro e lírico, que a sua reprodução ao vivo, por muito eficaz que seja, fica sempre um pouco aquém da experiência de estúdio. Um detalhe, todavia, que acaba por ser insignificante quando consideramos o quão bonito e recheado de ternura foi este serão. Vimos casais a abraçarem-se e a beijarem-se, pessoas a cantar as letras e testemunhamos um clima geral de paz, satisfação e carinho. Enquanto estiveram em palco, os Cigarettes After Sex fizeram-nos sonhar e sentir, tendo prolongado a sua estadia para, logo a seguir à magnífica “ Apocalypse”, nos brindarem com um encore constituído por “Please Don't Cry” “ Young Dumb”.
No topo da sua forma, os Cigarettes After Sex estão cá para ficar, independentemente de nem todos apreciarem a sua obra. Quem não entende aquilo que fazem continuará a não ficar convencido; quem adora, por outro lado, poderá contar certamente com mais capítulos nesta história de amor entre a banda e o público português.
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Organização:Ritmos
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terça-feira, 02 janeiro 2018