Reportagem Deafheaven no Porto
Os Deafheaven são, sem dúvida alguma, um dos casos mais fascinantes no actual panorama da música pesada. Ao longo dos últimos anos, o grupo de São Francisco tem dado muito que falar com o ecletismo da sua sonoridade, onde a agressividade e frieza do black metal convive harmoniosamente com a candura do shoegaze e a beleza etérea do post-rock. Essa viagem por diversos mundos musicais já lhes valeu rasgados elogios por parte daqueles que entendem esta exploração estilística e duras críticas por parte dos adeptos do tradicionalismo dentro do metal. Seja como for, uma coisa é certa: poucos serão aqueles que se mantêm indiferentes quando o nome da banda é mencionado, o que fez com que o seu regresso a Portugal para duas datas – uma em Lisboa e outra no Porto- suscitasse imenso interesse.
Foi ao som de “Brought to the Water” que os Deafheaven iniciaram uma memorável e intensa actuação - talvez a mais inspirada das suas visitas ao nosso país. Em fase de promoção ao mais recente “New Bermuda”, optaram por tocar o álbum todo, o que até acaba por ser compreensível se tivermos em conta que a maior parte das bandas se sente mais próxima da sua mais recente criação artística. Além disso, os temas do novo disco resultam extremamente bem ao vivo, não perdendo a força e emoção que têm em estúdio. Ao escutar composições como “Luna”, “Come Back” ou “Baby Blue” apercebemo-nos igualmente que “New Bermuda” é uma proposta extremamente equilibrada: apesar de se tratar possivelmente da obra mais abrasiva e pesada que os Deafheaven gravaram até agora, conserva toda a melodia e delicadeza sonora que também caracteriza o colectivo. Aliás, é precisamente essa dualidade, o confronto entre escuridão e luz, que os torna tão especiais e origina músicas ruidosas mas poéticas e sublimes, numa eterna dança entre fúria e graciosidade. Essa capacidade de derrubar barreiras e albergar uma panóplia de emoções explica igualmente o porquê de a plateia ser tão diversa – não havia somente fãs de metal na audiência mas também membros de outras “tribos”.
No entanto, todos tinham a intenção de apreciar a magnífica experiência sonora que o grupo proporciona, intensificada pelo registo apaixonado e explosivo do carismático vocalista George Clarke - detentor de arrepiantes berros ensurdecedores, que contrastam muito bem com os ocasionais momentos suaves da parte instrumental. Num concerto verdadeiramente arrebatador e que tem tudo para figurar em listas de melhores do ano, o final deu-se com “Sunbather” e “Dream House”. Quando saímos do Hard Club, sentimos que vimos uma grande banda no seu período áureo. Detractores à parte, os Deafheaven estão aqui para ficar.
Antes, Amalie Bruun - a líder do projecto Myrkur, aqui com banda - foi responsável pela primeira parte deste evento. Contudo, por muito interessante que a música desta senhora dinamarquesa seja em disco, ao vivo faltou ambiente e magia. Demasiado tímida e com claras dificuldades em tocar guitarra (compensando um pouco nos teclados), Amalie mostrou necessitar de mais experiência de palco. A mistura que faz de black metal com folk escandinavo resulta muito bem em estúdio, mas o concerto foi demasiado morno. Talvez no futuro a possamos ver com mais poder.
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terça-feira, 08 março 2016