Reportagem Deolinda no Porto
Nota-se que a música portuguesa está de boa saúde quando se tem diversas bandas a conseguir encher os Coliseus. Os Deolinda são o mais recente caso, onde, na passada sexta-feira, o Porto assistiu à comemoração dos 10 anos, dos 4 discos e à entrega, já famosa, de Ana Bacalhau e companhia.
Não é de estranhar ter o Coliseu esgotado. A afinidade que a banda ganhou no coração dos portugueses é fácil de sentir. Contam História de quem somos, com um olhar certeiro, curioso, malandro e vivido, tudo o que somos num ritmo de festa e partilha.
O concerto começou em jeito de memória com a primeira de todas, contavam eles posteriormente. Só com Ana Bacalhau a receber as atenções das luzes, ouvíamos “Não sei Falar de Amor”, seguidamente “Fado Castigo”, “O Fado Não é Mau”, que gerou o primeiro sinal de euforia e festim no púbico, com estes a bater palmas quase em desafio ao ritmo da música. Com “Mal por Mal” encerrávamos um bloco para Canção Ao Lado, o primeiro álbum de Deolinda, e estava na hora de, também cronologicamente, falar, tocar e celebrar os outros álbuns.
De Dois Selos e Um Carimbo, tivemos um início a tirar um pouco o pé do acelerador da festa que já estava instalada. “Entre Alvalade e As Portas de Benfica” deixou-nos respirar um pouco em preparação para “Não Tenho Mais Razões”, acompanhada por um bombo e pelo regresso a festa de “A Problemática Colocação de Um Mastro”. Duas músicas que são o povo português em plena verdade, e quem questiona isto, não é filho de boa gente.
“Há dias que Não São Dias” despediu-nos do período dedicado àquele que é o álbum mais entusiasmante da banda. Olhávamos agora para a primeira metamorfose da banda, o primeiro claro piscar de olhos à ideia mais pop mas não menos fado do grupo.
Contam-nos histórias do produtor deste disco, “um tal que já trabalhou com os Beatles, coisa pouca”, dizia a vocalista. Com ele aprenderam muito sobre a pop e moldaram um som um pouco mais vivo e com ele mudaram, também, o design do espectáculo. Agora as luzes colocavam-se no lugar da projeção e isso fez-se sentir muito no espetáculo. Ele cresceu e de que maneira! Que o digamos em “Musiquinha”, o tema que põe todos a dançar mesmo que não queiram, mas que também nos deixa de boca aberta quando um sample de guitarra elétrica se projecta pelo sistema de som da sala, com ele strobes e a ideia que depois disto o concerto tem de elevar de nível pois tínhamos um possível momento da noite a acontecer em pleno meio de concerto. Se é verdade que realmente não houve outro momento tão alto no concerto, também é verdade que o nível nunca baixou.
Já em “Outras Histórias”, a banda virou o bico ao prego e colocaram o público inteiro a cantar “Berbicacho” e derreteram corações em “Bons Dias” e “A Avó de Maria”. Criticaram a política em “Bote Furado” e puseram o público a agitar umas luzes distribuídas antes do concerto em “A Velha e o Dj”. Era a última música antes de uma série em jeito de “Best-off”. Primeiro com mais dois hinos de povo, “Seja Agora” e “Movimento Perpetuo Associativo”. Já no primeiro regresso a palco “Fon-Fon-Fon”, foi o disco mais pedido e também a música mais celebrada da noite. “Um contra o Outro” acaba por encerrar o encore com uma bravura e uma energia que não contávamos. O fado também pode ser “rock n roll” quando quer, mas é sobretudo uma entrega pessoal, uma emoção e foi com os Deolinda reunidos como se tivessem nas suas salas que fecharam com a música que representa melhor esse espírito de proximidade e emoção, “Dançar de Olhos Fechados” é possivelmente a música mais bonita de toda a discografia da banda, a última faixa de “Outras Histórias” e aquela que nos deixou com o coração mais quente de uma noite bem quentinha e de celebração.
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Organização:Sons em Trânsito
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sexta-feira, 22 novembro 2024