Reportagem Feist no Coliseu dos Recreios
Aqui vemos como as vozes das Mountain Man complementam a de Feist e não podemos deixar de pensar se o trio não terá sido criado com o único propósito de enriquecer ainda mais uma voz que já é de si tão poderosa e, sem mais, bonita.
Quatro anos volvidos desde a atuação na Aula Magna, Feist regressou para um concerto inesquecível, desta vez num Coliseu a rebentar pelas costuras que a recebeu de braços abertos. O foco principal foi o mais recente Metals, lançado em finais de 2011, que já conquistou muitos e de certeza cativou novos fãs. A fazer as vozes de fundo veio o trio americano Mountain Man.
A primeira parte esteve a cargo de Fionn Regan, músico irlandês, que tocou pouco e pareceu agradar a várias pessoas. Apresentou-se como sendo «Fernando Pessoa», o que lhe conferiu atenção por parte de todos desde o início. De entre os temas tocados, ouviu-se “100 Acres of Sycamore”, numa pequena mas calorosa atuação.
Já passava das 22h quando finalmente Feist subiu ao palco com a sua banda. Bem disposta, desde o início manteve contacto com o público, pedindo que este se manifestasse. “Undiscovered First” fez as honras e deu logo a conhecer Mountain Man, o trio que acompanhou Feist e se mostrou enérgico, bem disposto e perfeitamente coordenado. Para o caso de alguém não ter ficado convencido logo a princípio (coisa que duvido ter acontecido), “A Commotion” seguiu-se para tratar desses casos. A força com que Feist, Mountain Man e a banda cantava e tocava o tema mostrou bem o tipo de noite que iria ser: memorável.
Seguiu-se então a bela “Graveyard”, outro tema do novo disco, que ajuda a confirmar o sucesso que Feist tem vindo a alcançar de álbum para álbum. As letras de Metals estavam já bem decoradas pelo público, que cantou a plenos pulmões. “How Come You Never Go There”, primeiro single do último trabalho encerrou aquilo que pode ser considerado a primeira parte do concerto. Seguir-se-iam temas mais antigos, a começar por “Mushaboom”, recebida com entusiasmo e com direito a uma pequena aula de dança por parte de Leslie Feist. Aqui vemos como as vozes das Mountain Man complementam a de Feist e não podemos deixar de pensar se o trio não terá sido criado com o único propósito de enriquecer ainda mais uma voz que já é de si tão poderosa e, sem mais, bonita. Não é o caso, são bandas separadas, mas eis uma parceria que cantou e encantou, cativou e enfeitiçou com a sua afinação e coordenação perfeitas. “The Circle Married the Line” antecedeu outros dois temas mais antigos: primeiro “My Moon My Man” e depois “I Feel It All”, que constituíram o ponto (mais) alto do concerto.
Depois de tamanha explosão, foi tempo para conversar com o público. Chamou realeza às bancadas, galerias e camarotes; chamou plebeus à plateia, que ganhava por muitos no que vinha a concursos de demonstrações de entusiasmo (simplificando, gritos). Falava a cantar e não foi nada menos que a simpatia em pessoa. Dividiu o público em zonas e ensinou coros diferentes a cada uma delas, para a acompanhar na fenomenal “So Sorry” que se seguiu. Antes de “Anti-Pioneer”, fez questão de enunciar uma frase que alguém de confiança lhe tinha ensinado a dizer. Em português quase perfeito, exclamou: «Vocês são do c******!», para total e absoluto delírio da multidão.
“The Bad in Each Other”, outra retirada do último álbum (que foi tocado quase na íntegra), antecedeu “Pine Moon”. As Mountain Man foram apresentadas e presentearam o público com um tema cantado em a capella, antes de mais três temas retirados também de Metals: “Comfort Me”, “Caught a Long Wind” e a belíssima “Get it Wrong, Get it Right”. Tinha chegado o encore.
Quando a banda voltou, foi altura de as Mountain Man se chegarem à frente do palco, acompanhadas por Feist, que segurava uma guitarra. Cantaram uma música sem microfones perante uma multidão silenciosa (excluindo os habituais engraçadinhos) e em profunda admiração. De novo em frente ao microfone, chegava a altura de “Limit To Your Love”, recebida com entusiasmo. De novo concentrada em temas mais antigos, “Sealion” seguiu-se e “Let it Die” proporcionou mais um daqueles momentos tão bonitos que nem sabemos como descrever.
A banda voltou a abandonar o palco e muitos espectadores, sem se aperceberem que as luzes ainda não tinham sido ligadas, também saíram do recinto. Feist voltou a entrar em palco, desta vez sozinha e contou um episódio que lhe tinha acontecido no dia anterior enquanto passeava por Lisboa com a banda. Um rapaz e uma rapariga tinham-na abordado e levado para um recanto calmo, não para os assaltar (como por momentos, ela chegou a pensar), mas para lhes «ensinar uma música». Logo de imediato ouvimos gritos das bancadas e Feist pediu então ao duo que descesse e fosse ao palco cantar a mesma música para o Coliseu inteiro. Desafio de imediato aceite pelos dois. Subiram ao palco, nervosos, e, juntamente com o público, entoaram “Imagine” de John Lennon. Feist assistia do piano e aplaudiu tão entusiasticamente como fora aplaudida o concerto inteiro. Um momento inesquecível para os dois amigos e arrepiante para qualquer um dos presentes.
Quando ambos já tinham abandonado o palco, Feist ainda perguntou se alguém sabia tocar bem piano clássico, mas sem sucesso. Entregou-se então a “Secret Heart”, apenas ela e a guitarra (que toca tão bem!) e encerrou o concerto com “Intuition”. Ambos os temas proporcionaram o momento mais íntimo do concerto – a artista e a sua guitarra perante um mar de fãs mais que entregues ao que ela tinha para dar.
É isso mesmo que faz de Feist a Artista com A grande: a total entrega aos seus temas, aos álbuns que escreve e compõe, aos concertos que dá. A voz não desafina um instante que seja, os dotes que mostra ao pegar na guitarra são magistrais e a simpatia com que recebe os fãs é admirável. Por mais saudades que alguns de nós possam ter de Broken Social Scene, é inegável a riqueza que Feist traz à música e o que a sua carreira a solo significa no cenário musical dos dia de hoje. Aguardamos avidamente um novo regresso, mas até lá, deliciamo-nos com Metals e a memória de um concerto que ficará para a história.
{artsexylightbox path="images/stories/Reportagens/Feist_18032012" previewWidth="100" previewHeight="100" color="new_black" carousel="true" carousel_visible="8"}{/artsexylightbox}
-
sábado, 20 dezembro 2014