Reportagem Moullinex no Porto - 2017
Luís Clara Gomes, mais conhecido como Moullinex, é uma das figuras mais elogiadas do panorama musical nacional, e com razão: o som que produz constitui alguma da mais excitante electrónica de influência pop que ouvimos nos últimos anos, permitindo ao ouvinte escapar momentaneamente do cenário desolador que é por vezes a rotina diária através da dança e da união a ela associada; foi precisamente esse conceito que o músico, DJ e produtor explorou no mais recente “Hypersex”, álbum que apresentou na semana passada na Casa da Música, perante uma Sala 2 completamente esgotada.
No entanto, esta passagem foi muito mais do que um mero concerto, pois Moullinex proporcionou um impressionante e riquíssimo espectáculo. Chega a ser difícil mencionar todos os destaques desta festa de proporções épicas, mas podemos dizer que Ghetthoven interpretou diversas personagens num registo teatral com muito humor à mistura, e que houve elaboradas projecções e até manipulação de imagens através do uso de um painel verde para aplicar a técnica chroma key, o que fazia com que os músicos aparecessem no ecrã principal com um fundo diferente; tivemos igualmente direito a convidados especiais como os Best Youth, a Marta Ren ou mesmo XINOBI, que abrilhantaram uma prestação já por si absolutamente maravilhosa; e o que dizer da ausência de barreiras entre banda e público? Moullinex esteve em palco, mas também passeou pela audiência; esta permaneceu maioritariamente no seu espaço, mas algumas pessoas subiram ao palco para dançar – e porque não? Que sentido existe em manter uma hierarquia quando se trata de música de dança? A palavra de ordem aqui era celebração, e Moullinex desempenhou exemplarmente o papel de anfitrião, oferecendo aos presentes uma alucinante viagem sonora e espiritual.
Por entre temas mais antigos como “Superman”, “Undertaker” e novidades como “Carnival”, “Morse Code”, “Painting By Numbers” ou a irresistível “Love Love Love”, assistimos a uma actuação inesquecível, que para sempre recordaremos num misto de saudade e alegria.
Nota igualmente positiva para o ambiente de diversão pacífica que caracterizou esta noite de concertos. Numa sociedade actualmente dominada pelo terrorismo e um clima geral de desconfiança, a arte de Moullinex promove a harmonia e o amor entre todos, numa inspiradora utopia que enfatiza o papel crucial que a cultura pode e deve ter na criação de novas formas de pensar e de ver o mundo que nos rodeia. Ainda que não seja tão político como outros artistas, Moullinex acaba por ser um agente da paz numa realidade cada vez mais violenta, doente e assustadora. Precisamos de mais músicos como ele.
A primeira parte foi assegurada por XINOBI, colega de Moullinex na Discotexas e autor de um dos melhores discos nacionais deste ano – “On The Quiet”. Em formato banda, onde se incluía Ana Miró (Sequin), XINOBI foi o aquecimento perfeito para o que se seguia. A exemplo de Moullinex, também explora os territórios da electrónica ao mesmo tempo que vai beber à pop, sobretudo no último registo e num single como “Far Away Place”, um dos momentos altos de uma actuação bem conseguida e que deixou claro que a cena nacional está a passar por um período de elevada criatividade.
Era já de madrugada quando abandonamos a Casa da Música, mas a verdade é que não nos sentíamos cansados ou com vontade de dormir… estávamos ainda sob o efeito da magia de uma noite inegavelmente perfeita.
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terça-feira, 02 janeiro 2018