Reportagem The Mars Volta em Lisboa
The Mars Volta vão sempre ser The Mars Volta, e tocam o que quiserem que os leais fãs adoram, pois são tão genuinamente criativos e peritos que nunca se afastam do interessante, opondo-se a outras bandas que se perdem ao longo da carreira
Poucas bandas são mais eficazes do que os The Mars Volta na divisão de opinião pública. Estes parecem suscitar, na sua maior parte, quer o ódio quer a adoração, e opiniões extremas dos dois lados do espetro. No entanto, se há alguma coisa que sabem fazer, é tocar ao vivo – e esta última visita em Portugal não deixou dúvidas nenhumas em relação à sua prestação. Acompanhados pelas Le Butcherettes, os The Mars Volta deram novamente um concerto para recordar, naquela que foi a apresentação de Noctourniquet em palco português.
Muito interessante foi o concerto de abertura, dado pelas mãos das mexicanas Le Butcherettes. São constituídas por Teri Gender Bender (voz e guitarra) e Normandi Heuxdaflo (bateria) e tocam um garage rock muito particular, muito assente no carisma e no poder vocal de Gender Bender, que faz tudo para chocar a audiência. Acompanhadas por Omar Rodriguez-Lopez, dos Mars Volta, no baixo, deram um concerto energético e mostraram-se bem mais capazes ao vivo do que em estúdio. “I’m Getting Sick of You”, “Henry Don’t Got Love” e “Dress Off” foram alguns dos temas tocados do álbum Sin Sin Sin, produzido por Rodríguez-López. Pode-se, então, dizer que abriu o apetite para a banda vindoura e não desiludiu.
Já com um recinto a três quartos, os The Mars Volta entraram em palco e abriram o concerto com ‘The Whip Hand’, do recente Noctourniquet (2012). Este é o sexto esforço coletivo da banda que apenas contém Cedric Bixler-Zavala e Omar Rodríguez-López do elenco original e já conta com mais de 10 anos de carreira. Noctourniquet continua a linha musical de Octahedron, que vê uns Mars Volta mais simples, mais calmos, sem perder a essência, mas também menos frenéticos e ecléticos do que no material inicial do seu trajeto musical. Estes afirmam que é uma mudança drástica de som, apontando-o como ‘future punk’ – e consegue-se perceber essa intenção em temas como ‘Aegis’ e ‘Molochwalker’. Uma sonoridade bizarra, não deixando de ser melódica, apoiada nas teclas de Lars Stalfors e numa influência mais eletrónica, marcam Noctourniquet e traduz-se de forma excelente para o palco ao vivo.
Claro que tudo isto é enaltecido por uma perícia no manuseamento de instrumentos invejável – a guitarra de Rodríguez-López delicia o público e Deantoni Parks mostra-se uma boa substituição para antigo Thomas Pridgen numa bateria imparável. Até Cedric Bixler-Zavala canta melhor, muito ajudado por uma maior bonança dos novos temas, que o ajudam a recuperar o fôlego. Em ‘The Malkin Jewel’, tenta ser o mais dramático e teátrico possível em devaneios vocais com delay e não hesita em visitar o público do outro lado do fosso, causando a histeria geral nas filas dianteiras. “Este sítio parece uma nave”, afirmava Bixler-Zavala, “espero que se agarrem e disfrutem da nave dos Mars Volta”. E é assim que embarcam numa jam de quase 15 minutos (“Broken English Jam”), mostrando que nunca deixaram de ser os reis da criação e improvisação (olhe-se para o extensivo trabalho a solo de Rodríguez-López) e que retiram o maior prazer disso mesmo.
Se há algum defeito que lhes podemos apontar é que os Mars Volta são incrivelmente autoindulgentes quando tocam ao vivo, notando-se uma setlist praticamente cheia de material de Noctourniquet, e eles estão bem cientes disso - “Obrigada pela vossa atenção”, declama o carismático vocalista. Depois de tocarem o que desejam, entregam-se a dois ‘docinhos’ para o público, ‘The Widow’ (o tema mais comercial da banda) e a apoteótica ‘Goliath’ (o grande trunfo de The Bedlam in Goliath), mas faz-se o reparo de que uma setlist muito mais equilibrada certamente faria com que o nível deste concerto estivesse muito mais acima do que esteve. Porém, The Mars Volta vão sempre ser The Mars Volta, e tocam o que quiserem que os leais fãs adoram, pois são tão genuinamente criativos e peritos que nunca se afastam do interessante, opondo-se a outras bandas que se perdem ao longo da carreira. Que na próxima vez em terras lusas se mostrem tão aliciantes como sempre.
{artsexylightbox path="images/stories/Reportagens/The_Mars_Volta_14062012" previewWidth="100" previewHeight="100" sort="asc" color="new_black" carousel="true" carousel_visible="8"}{/artsexylightbox}
-
sábado, 20 dezembro 2014