NOS Alive - 13 Julho 2018
Dos três dias, foi o último a esgotar, mas a nível de qualidade, o segundo dia do NOS Alive 2018 equipararia os restantes dois. Em dia eclético, a música do 13 de Julho começou bem cedo, com o rock a ser a principal atração do dia, onde Queens of the Stone Age seriam o cabeça de cartaz.
Em pouco mais de um ano e um mês, os Japandroids subiram três vezes a palcos portugueses; depois de um NOS Primavera Sound em Junho e um Vodafone Paredes de Coura em Agosto, ambas no ano passado, chegou agora a vez de Lisboa acolher a dupla de garage rock, talvez um pouco cedo demais para o que lhes é hábito.
Com um Palco Sagres já meio preenchido, os canadianos não foram de cerimónias e libertaram todo o seu rock vivaço e enérgico, prontos para instaurar caos. Com o som alto e bem distorcido, tal como no garage rock se quer, Brian King e David Prowse ofereceram um punhado de malhas, como “No Known Drink or Drug”, “Younger Us” e “The House That Heaven Built”, disfarçado de presságio de como este 13 de Julho seria um dia repleto de intensidade.
Dito e feito, o ritmo rockeiro seguiu a todo o gás para o Palco NOS, onde os Black Rebel Motorcycle Club já debitavam o seu rock ‘n’ roll com influências emprestadas aos blues. De ritmos galopantes, daqueles que suscitam ao headbanging, o tripleto canadiano proporcionou uma hora repleta de intensidade frenética em que a banda nunca conseguiu, nem quis, abrandar o velocímetro.
De riffs rasgados e estrondosos, onde o baixo de Robert Levon Been, disfarçado de guitarra, faz de elemento condutor de toda a performance, o serão dos Black Rebel Motorcycle Club não só matou uma saudade que já durava de 2013 como certamente angariaram uns quantos curiosos à sua causa rockeira. Percorrendo alguns dos seus maiores êxitos, como “Beat The Devil’s Tattoo” ou “Spread Your Love”, os B.R.M.C. acabariam o concerto com a pergunta do costume, “Whatever Happened to My Rock ‘n’ Roll”; julgando pela atividade da banda, este está vivo e recomenda-se.
Supostamente, ter-se-ia um encontrado marcado com os The Kooks, às 19h50, para se reviver os êxitos de uma adolescência que davam pelos nomes de “Naive”, “Sofa Song” ou “She Moves In Her Own Way”. Por ordem médica, a voz de Luke Pritchard teve que ser encostada às boxes e, como substitutos, os Blossoms regressaram ao NOS Alive pela porta grande, isto quando, no ano passado, atuaram no (então) Palco Heineken.
Em papel, a troca de uma banda indie pop por outra teria tudo para dar certo, mas infelizmente para os Blossoms, preencher a vaga dos The Kooks não era em nada uma tarefa fácil, ou não fosse a antecipação pelo regresso dos autores de “Naive” imensa. Apesar do hype em torno dos Blossoms estar ao rubro por Inglaterra, o mesmo não se sucede por cá, com um público demasiado murcho para uma banda que até assinou um concerto competente.
Mesmo com um novíssimo disco na calha, Cool Like You, lançado este ano, os Blossoms conciliaram-no com o estreante homónimo para entreter uma plateia apreensiva, que pouco ou nada conhecia do quinteto britânico, mas que com a chegada das vibrantes “Honey Sweet”, “Cool Like You” e “Blown Rose” lá que se deixou ir pela sonoridade simpática destes rapazes.
A nível de manifesto por parte do público, esta só viria próxima do fim, numa versão improvisada de “Naive” dos The Kooks, onde a plateia pediria o microfone emprestado a Tom Ogden, e em “Charlemagne”, maior êxito dos Blossoms e possivelmente a única música que o público detinha conhecimento depois de uma rápida pesquisa no dia anterior face ao cancelamento dos The Kooks. Se mereciam mais? Sim, mas ficou no ar a sensação de dever cumprido.
E já lá vão quinze. Quinze concertos em que os The National foram acolhidos de braços bem abertos pelo público português. Quinze ocasiões em que houve total comunhão entre banda e público. Quinze instantes em que perdemos a noção do tempo e em que nos tornamos crentes da religião ‘Berninger’.
Na bagagem, há Sleep Well Beast para ser (re)apresentado em Portugal, isto depois de um Coliseu dos Recreios esgotado em Novembro último e que levaria mesmo a banda de Cincinnati a ser a primeira confirmação para o evento de Algés. E é mesmo à boleia do mais recente disco que a coisa se começa a desenrolar, com a pacata “Nobody Else Will Be There” a anteceder a raivosa “The System Only Sleeps In Total Darkness”. A estas juntou-se “Don’t Swallow The Cap” e era oficial: o público já estava na mão dos The National.
Se os The National começaram a apalpar o terreno dos sentimentos do público logo ao início, é em “Walk it Back” e “Guilty Party” que se dá a invasão plena, brincando com as nossas emoções sem que ninguém tenha o discernimento de pedir que parem, aliás, ninguém o quereria. Os The National têm a capacidade de nos oferecer conforto, de apaziguar o espírito enquanto sussurram que tudo vai ficar bem; no espaço de meros minutos, os concertos tornam-se numa terapia conjunta, em que “I Need My Girl” quase que nos pede para deitar cá para fora toda a tormenta que se tem tentado suportar.
Por mais habilidosos que os irmãos Dessner e Devendorf sejam enquanto músicos, a estrela da companhia é sem sombra de dúvidas Matt Berninger, que tanto consegue levar a um misto de emoções protagonizado por homem vulgar em “Carin at the Liquor Store” – o combo de piano e guitarra de Aaron e Bryce Dessner é hipnotizante neste tema – como adoptar uma personalidade rockeira e irreverente em”Day I Die” e “Graceless”, furando pelo público em busca de uma cerveja no balcão Sagres mais próximo, enquanto saúda os fãs com abraços ternurentos e sentidos.
Com o Passeio Marítimo de Algés a entrar numa dimensão de melancolia ao som de “Fake Empire”, cujo abalo emocional se mantém intacto com o passar dos anos, a viagem dos The National estaria perto do fim, mas não antes sem a fortíssima dupla “Mr. November” e “Terrible Love” e, para se acabar em beleza, “About Today”, a puxar ao sentimento, a deixar-nos com uma lágrima no canto do olho e fazer-nos contar os dias pelo 16º concerto dos The National em Portugal. Afinal, eles próprios é que dizem que alguns dos seus concertos preferidos aconteceram no nosso país…
Se os The National embarcaram num oceano de sentidos, os Queens of the Stone Age vieram numa onda completamente distinta, navegando em mares de rock nu e cru mais do que capaz de refrescar um público sedento por música ‘da pesada’. Para além de liderarem a frente do rock do século XXI, os Queens of the Stone Age tornaram-se também numa das melhores bandas ao vivo da atualidade, e foi isso mesmo que ficou comprovado no NOS Alive.
Apesar do mais recente Villains conter umas quantas influências a puxar o pé para a dança, um pouco culpa da produção levada a cabo por Mark Ronson e que não caiu em muito bom grado pelos fãs da banda, este registo dissipa-se por completo quando transposto para palco, com “Feet Don’t Fail Me” e “The Way You Used To” a comprovarem-no. Minutos depois, juntavam-se a clássica “A Song for the Deaf” e “Smooth Sailing”, cimentando cada vez mais a entrada rompante e explosiva dos Queens of the Stone Age em palco.
“The Evil Has Landed” insistia em querer demonstrar o quão bom Villains consegue soar ao vivo, e é difícil de negar o facto. Porém, o que o público queria mesmo era ouvir os grandes êxitos que tornaram os Queens of the Stone Age como uma das mais incontornáveis bandas de rock dos últimos tempos. Desejo pedido, desejo recebido, com “In The Fade”, “You Think I Ain’t Worth a Dollar, but I Feel Like a Millionaire” e “No One Knows”, com esta última a ter um demolidor solo de bateria assinado por Jon Theodore, cuja raiva atrás nos pratos poderia ser traduzido, em gíria, para “a partir a loiça toda”.
Entre múltiplas palavras de apreço para o público português, com “nós adoramo-vos” e “estão a gostar?” a serem as mais recorrentes, Josh Homme, homem cheio de ginga, não esconde a satisfação em ter uma plateia rendida às suas canções, com as lembranças de …Like Clockwork na pele de “I Sat By The Ocean” e “If I Had a Tail” a serem dos pontos mais altos do concerto até aquele momento.
Abrandando o ritmo para impor o clima de sedução em “Make It Wit Chu”, bem entoada nas linhas da frente do Palco NOS, para depois intensificar o volume ao som de “Little Sister” – com direito a dedicação especial para as senhoras da plateia – “Go With the Flow” e acabar na beleza caótica e destrutiva de “A Song For The Dead”, os Queens of the Stone Age arrasaram com o Palco NOS, em que ninguém se importou de ser cúmplice deste tumulto.
Mesmo andando nestas andanças desde 2006, foi apenas em 2014 que os Future Islands deram o salto para a fama com o aclamado Singles, um autêntico hino ao synthpop. Depois de terem estado no NOS Alive há três anos, o projeto chefiado por Samuel Herring regressou à casa onde já foi feliz para repetir a dose.
Com o concerto a arrancar ao som de “Ran”, todas as atenções centram-se de imediato em Samuel Herring e na sua performance que tanto é marcante como teatral. Entre danças esquizofrénicas, gritos a relembrar os de um vocalista de metal e uma presença contagiante, Samuel Herring não deixa ninguém indiferente. Pode não ser o frontman mais charmoso de sempre, mas quando se adiciona uma coletânea de canções bonitas e eletrizantes como “A Dream of You And Me”, “Seasons” ou “Before The Bridge”, a receita para o sucesso é garantida, e os Future Islands souberam-no provar a um Palco Sagres à pinha para os ver.
Chegando-se ao Palco NOS, era difícil de saber se os Two Door Cinema Club estavam a tocar a setlist ao contrário, tal não era o disparo de êxitos por todos os lados: em quinze minutos, ouviu-se “Undercover Martyn”, “I Can Talk”, “This is The Life”, “Are We Ready?” e “What You Know”. Assim. De rajada e de seguida. Um começo de concerto cheio de pompa e circunstância, sem dúvida alguma.
Mesmo depois de terem tocado as canções favoritas do público, os Two Door Cinema Club devem ter ficado radiantes perante o caloroso afeto que o público do NOS Alive demonstrou durante todo o concerto, cantando e batendo pé ao som de canções como “Changing of the Seasons”, “Sleep Alone” ou “Come Back Home” como se hinos se estádio se tratassem. Após uma dúbia passagem pelo MEO Sudoeste o ano passado, certamente que soube bem ao trio ser acolhido de forma tão acolhedora por parte de um público que, fosse aos pulos ou às cavalitas, acabou este segundo dia do NOS Alive em total estado de euforia.
N.R.: Por motivos alheios à vontade do Festivais de Verão, não nos foi possível fotografar Queens of the Stone Age e Two Door Cinema Club.
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quinta-feira, 19 julho 2018