Reportagem Moita Metal Fest 2016
Mais um ano de romaria ao já mítico Moita Metal Fest que é cada vez mais o festival do underground por excelência, pois tem a capacidade de reunir inúmeras tribos em torno de um único propósito que passa por revelar principalmente boa música. Durante uma maratona de dois dias, contámos com os cabeças de cartaz Entombed A.D. e Tankard, entre outras bandas estrangeiras e nacionais de renome.
Embora um festival de metal, mas que tem vindo a revelar-se mais eclético nos últimos anos, o Moita Metal Fest começou no seu primeiro dia com bastante rock, mais concretamente com o hard rock dos Hotkin. Com a responsabilidade de abrirem as hostes festivaleiras, estes rapazes de Setúbal não deixaram transparecer a sua extrema juventude, pois assumiram sempre a sua actuação com bastante maturidade. Exemplo disso foi o sólido desempenho em temas como "Do It Again" ou o rasgado "Let Me Hold You", com especial destaque para "Hellfire". Os Hotkin provaram que os estilos musicais são intemporais, merecendo uma audível ovação, depois de se despedirem com "Deathway". Da nossa parte, longa vida aos Hotkin!
Ainda na senda do rock, desta vez alternativo e perante uma sala mais composta, subiram ao palco os Sunya que contam na bagagem com o seu primeiro álbum intitulado "Missing Piece", e que tão vigorosamente o divulgaram. Liderados pela enérgica Kaddy Xavier, possuidora de uma excelente voz, os Sunya deram-nos uma portentosa amostra daquilo que são capazes, já que o horário era seguido à justa. Ainda assim, temas como o cativante e pesado "Missing Piece", a boa versão de "The Promise You Made" dos Cock Robin - que deixou muitos surpreendidos - ou o tema em português "Sombras", revelaram bem o valor deste conjunto de Póvoa de Santa Iria.
Já com o recinto cheio e tudo a postos para um ambiente mais pesado, no bom sentido, escutava-se como introdução o tema mais conhecido do filme "O Predador", antevendo que ninguém poderia escapar ao som dos Neoplasmah. Com uma matriz sombria e teatral, a banda de death/black metal estendeu-se pelos seus únicos álbuns e levou-nos para outras galáxias, cuja matéria negra era composta por exemplo por "Sidereal Passage" ou "Auguring the Dusk of a New Era", tema este que dá nome ao seu último registo, lançado em 2014. Consagrada a actuação, os Neoplasmah despediram-se com "Stargate to Infinity", e com isso desejamos: To infinity and beyond!
A sala ia certamente aquecer com circle-pits e stage dives, pois a seguir tínhamos os For The Glory que limitaram-se a incendiá-la, começando logo por se apresentarem aos mais distraídos com "FTG". Num ritmo "non-stop", os lisboetas presentearam o público com os seus temas mais conhecidos, a saber "Dark Times", "Some Kids Have no Face”, "Drown In Blood", havendo ainda tempo para um tema novo. Nós apostamos "Don´t Judge Me", mas os rapazes é que saberão certamente. Apesar de alguns percalços físicos e técnicos, a banda concedeu provavelmente o desempenho mais pujante da noite, ainda com a agradável promessa de um disco novo para o final do ano, para gáudio dos seus seguidores, provando mais uma vez que é literalmente uma banda feita de sangue, suor e hardcore!
Outro desempenho bem pujante tiveram os Switchtense que, a jogarem em casa, deram tudo, como é seu apanágio. Para além disso, deram o seu novíssimo álbum "Flesh & Bones" a quem possuísse o bilhete do festival, mas nada como escutar ao vivo alguns temas do novo registo, como “All or Nothing”, primeiro do álbum e do concerto, “Super Fucking Mainstream” ou aquele que foi o primeiro avanço oficial da banda, "Ignorance is Bliss". Sempre na máxima força, o quinteto da Moita não quis deixar de lado algumas músicas que já são consideradas hinos por parte dos seus fãs e tocou também “Face Off” e “Into the Words of Chaos”, entre outras, enquanto o caldeirão fervilhava com mosh, stage dives e circle-pits.
Para o final, os Switchtense ainda tinham alguns segundos de sobra e despediram-se com a curtíssima, mas poderosa "Monsters".
Como cabeça de cartaz para o primeiro dia, estava reservada a nova alma dos Entombed, ou seja os Entombed A.D. de regresso ao nosso país, os suecos começaram com alguns temas do seu novo "Dead Dawn". Embora com um início a meio gás, tudo se tornou mais combustivo, quando a banda tocou alguns êxitos há muito reconhecidos como "Living Dead" ou "Revel in Flesh". Já com algum stage dive digno de registo, os Entombed A.D. mantiveram-se na mesma toada e bastante comunicativos, principalmente através de Guilherme Miranda que, não só dava uns toques no português, incentivando o público a fazer barulho, como também grandes toques na sua guitarra. Depois do clássico "Left Hand Path", e de uma breve pausa, a banda voltou para mais alguns temas antigos e fechou a sua actuação com chave de ouro (ou metal?), deixando a soar nas colunas o tema "In League With Satan" dos britânicos Venom.
Para darem início à maratona do segundo dia, subiam ao palco e à hora marcada os Mindtaker do Redondo, distrito de Évora, que animaram o pouco público que deambulava pelo recinto. Para isso, serviram-se do seu thrash metal da velha guarda e de boas malhas como “Fuck Off” ou “I’m The Kid”. Diante de um punhado de vozes finalmente afinadas, havia que refrescá-las e, como bom incentivo, a banda despediu-se com "Drink Beer For Thrash", tornando-se assim e no final de contas numa agradável surpresa.
Outra agradável surpresa foram os don't disturb my circles que cativaram um espaço mais composto, através do seu misto de mathcore e post-hardcore. A banda de Lisboa apresentou-se com o seu último registo, “Lugubrious Cacophonous”, que data de Fevereiro de 2015, e fez questão de o tocar na íntegra. Desse mesmo registo, salientam-se temas como "Devoid", "Debris", "Harsh" ou "Ruinform" que perfilaram a excelente actuação de uma banda com uma forte atitude em palco.
Tudo parecia pronto para a missa sombria que os Martelo Negro preparavam-se para celebrar. Com o seu já conhecido black/thrash metal bem "speedado", a banda iniciou o seu culto ao ritmo de, claro está, "Culto Hermético" e "Inferno Abysmal". Para além de ser uma legião conhecedora dessas orações em nome de Lúcifer, a mesma manifestava-se através do típico "horns-up", enquanto vibrava ao som de "Equinócio Espectral" ou "Hierofante Em Chamas", tema este que contou com a participação de Carina Domingues, vocalista dos Disthrone. A banda lisboeta concedeu no geral uma actuação que, a todo o galope, se revelou sólida, terminando com "Sob os Cascos de Satã".
De regresso aos palcos no final de 2015, a locomotiva Ho-Chi-Minh preparava-se para mostrar à Sociedade Filarmónica Estrela Moitense que estava oleada e bem oleada. Embora sem tocar temas novos, pudemos escutar boas músicas que pertencem ao álbum "It Has Begun" de 2009, como “My Decline” ou “I Hope You Never”. A banda de Beja prometeu iniciar as gravações dos temas em Maio, por isso se o novo álbum dispor da mesma energia que os Ho-Chi-Minh dispõem em palco, teremos certamente um excelente álbum.
No final da tarde, chegou a vez dos Grankapo mostrarem também que estão vivos e bem vivos. A banda de Lisboa liderada por Rui Correia, ou Fuck para os amigos, deu um recital de hardcore, mas ao contrário dos Ho-Chi-Minh, revelou dois temas novos, nomeadamente a simbólica "Won’t Fall Down" e "Burn", não ficando contudo por aqui, já que não faltaram hinos como "Left For Dead" e "We’ll Never Die". Como forma de agradecer a todos os presentes, a banda terminou com "Grankapo", debaixo de uma grande ovação.
De volta ao Moita Metal Fest, depois de terem feito parte do cartaz de 2013, os portuenses Dementia 13 estavam mais que prontos para o seu primeiro concerto de 2016, até porque tinham o perfeito incentivo do seu álbum de estreia "Ways Of Enclosure", do qual extirparam malhas como "Orgy of Bloodshed", "They Never Found His Body" ou "Conceived In Violence", originando muitos circle-pits e stage dives. Todavia, a banda não se esqueceu de relembrar o seu EP "Tales For The Carnivorous", lançado em 2013, e tocou com toda a garra os temas “There Are Those Who Kill Violently” ou "Dark Urges”. Desse mesmo EP, "Brotherhood Of The Flesh" foi o tema escolhido para os Dementia 13 finalizarem a sua actuação, deixando a irmandade do death metal notoriamente satisfeita.
Também de volta ao festival, depois de terem tocado na Moita em 2013, os WEB, que já contam pelo menos com 30 anos de carreira, trouxeram o seu thrash metal tocado com mestria e algumas músicas bem orelhudas, principalmente do álbum "Everything Ends", lançado em Maio do ano passado. "Vendetta", "God Of Nothing" e "Death My Enemy" fizeram parte do alinhamento da banda do Porto, como também temas mais antigos, como por exemplo "Resilient Casket" do álbum "Deviance", lançado em 2011. Os WEB são acima de tudo um exemplo de união e, depois de mais um bom concerto, dão todo o sentido ao seu mote "30 Years At Your Service".
Regressámos ao hardcore, mais propriamente ao hardcore de Setúbal, com os Hills Have Eyes. Como estreante no Moita Metal Fest, a banda quis deixar boas indicações, o que acabou naturalmente por acontecer, muito devido ao público que vibrou com a mesma e que se desdobrou em muitos moshpits e stage dives ao som de temas de "Antebellum", o último registo da banda. Outros temas do repertório deste quinteto fizeram também vibrar os fãs que entoaram o início de "All At Once", sendo que para o final ficou reservado provavelmente o tema mais conhecido dos Hills Have Eyes, a saber "Strangers", o que originou uma merecida e forte ovação.
Em representação do crust nacional, chegava a vez dos Simbiose suarem essa camisola e tocarem sem parar temas que já fazem parte da memória colectiva. Casos de "Ignorância Colectiva" e "Acabou A Crise Começou A Miséria", músicas com que a banda iniciou o concerto, provocando desde logo uma extrema agitação na sala. Mais temas do último álbum, "Trapped", se seguiram, como "Modo Regressivo" e "Será Que Há Morte Depois Da Vida?", mas a banda seguia também com todo o pulso por outras paragens ao som de "Total Descontrolo", "Parados, Humilhados e Calados!" ou "Economical Terrorism", malhas do álbum anterior. Um concerto bastante sólido de uma banda que pratica a verdadeira música de intervenção.
Seguiu-se a carnificina, pois os Haemorrhage estavam em palco com uma enorme vontade de realizar uma cirurgia auditiva. A rasgarem com o seu goregrind, os madrilenos nunca deram descanso ao público que se amontoava em intensos moshpits, o que não era para menos, já que era impossível ficar parado ao som de descargas sonoras como "Traumageddon" ou "Flesh-devouring Pandemia". No seu jeito pandémico e muito teatral, já que não faltavam partes do corpo humano, nomeadamente uma perna e um cérebro de certa forma comestíveis, a banda continuou com outros temas sangrentos como "Dissect Exhume Devour" e "Decom-posers", fazendo ainda questão de tocar "Forensick Squad", música nova que pertence ao split EP com os holandeses Rompeprop, lançado recentemente.
Expectativas separadas, perdão, superadas e um Moita Metal Fest rendido aos Haemorrhage que realizaram uma excelente actuação.
Mais uma excelente actuação desta vez com The Parkinsons que, apesar de se sentirem deslocados, acabaram por fazer esquecer rapidamente esse pormenor, pois proporcionaram um concerto bastante caloroso, quer devido à habitual atitude voadora de Afonso Pinto, à nudez de Victor Torpedo e não só, ou ao estado febril de Paula Nozzari. Desde "Bad Girl", com que iniciaram o caos, passando pela já mítica "Angel in the Dark" ou "Too Many Shut Ups", a nata do punk nacional não deu tréguas aos fãs que respondiam com muitos stage dives. Não há dúvida. The Parkinsons continuam a ser "4 miúdos portugueses, que, numa dieta de sujidade, distorção e feedback, vivem para partir tudo e deixar tudo em confusão"!
Num recinto a rebentar pelas costuras, enquanto se respirava euforia, subiam ao palco uns dignos representantes do "beer metal", de forma a encerrarem em beleza a edição deste ano do Moita Metal Fest. Quer fosse baseado nos seus álbuns mais recentes, quer fosse baseado no old school, os Tankard incluíram o que de melhor tem o seu repertório, já que a destruição foi sempre causada de cerveja na mão, sorriso na cara e ao som de "Die With a Beer in Your Hand", "RIB" ou a romântica "A Girl Called Cerveza". Estes veteranos de Frankfurt am Main nunca abrandaram o ritmo da actuação, e nem uma breve pausa, já no final, serviu para acalmar as hostes que se mostravam a par do currículo da banda. Muito pelo contrário, pois os Tankard voltaram para um encore ainda mais devastador, culminando num encerramento apoteótico. Um brinde aos Tankard!
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terça-feira, 19 abril 2016