Reportagem NOS Alive 2015
Amílcar Sousa
A equipa do FDV acompanhou a 9ª edição do NOS Alive, que teve lugar entre 9 e 11 de julho de 2015. Este foi inevitavelmente o festival dos Muse, não tivessem sido eles os grandes responsáveis pelo facto de os bilhetes para o primeiro dia terem esgotado. O Alive ficou também marcado por regressos pela porta grande (Alt-J, Sam Smith e Disclosure, desta vez todos no palco principal), por desilusões (cancelamentos de Jessie Ware e Stromae), pelo culto a um álbum de exceção ("Psychocandy", dos The Jesus & Mary Chain) e pela confirmação do valor das bandas nacionais.
Mas este foi igualmente o festival do humor e da arte urbana, das famílias e das preocupações ambientais, dos finais de tarde quentes e das noites frias, dos chapéus brancos e das pulseiras com chip, das bandeiras patrióticas e dos cachecóis dos clubes de futebol, dos tuk-tuk e dos free-hugs e, porque não, da frase “Haja alegria, haja Casal Garcia!”, repetida vezes sem conta. Através do nosso roteiro cronológico, descobre tudo o que se passou lá!
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THE WOMBATS | YOUNG FATHERS | JAMES BAY | CAPITÃO FAUSTO | BEN HARPER | METRONOMY | ALT-J | MUSE | DJANGO DJANGO | FLUME | BLASTED MECHANISM | MARMOZETS | BLEACHERS | CAPICUA | SHEPPARD | THE TING TINGS | MUMFORD & SONS |FUTURE ISLANDS| THE PRODIGY | JAMES BLAKE| RÓISÍN MURPHY | HMB | COUNTING CROWS | DEAD COMBO | SAM SMITH | MOGWAI | THE JESUS AND MARY CHAIN | CHET FAKER | AZAELIA BANKS | DISCLOSURE | CHROMEO
DIA 1 – 9 de JULHO | FOTOS
THE WOMBATS | 18:00 | PALCO NOS
Com o sol a brilhar intensamente, o palco principal abriu com os The Wombats. A banda de Liverpool estreou-se finalmente em solo luso, após um cancelamento no Festival de Paredes de Coura, em 2008. Com três longa duração na bagagem, o alinhamento baseou-se sobretudo em "Glitterbug", editado no passado mês de abril. Liderados pelo comunicativo vocalista Matthew Murphy (que se desdobrou ainda na guitarra e nos sintetizadores), conseguiram agarrar os mais madrugadores com um conjunto de canções syth-pop que ficaram no ouvido. Foi notória a boa disposição da plateia em canções que convidaram à dança, como é o caso de "Greek Tragedy", "Give Me a Try" e "Tokyo (Vampires & Wolves)". Fecharam com o inevitável "Let's Dance To Joy Division", com o público a cantar no refrão “Everything is going wrong, but we're so happy”. A verdade é que as coisas não lhes correram nada mal e, sim, estavam mesmo contentes quando abandonaram o palco.
YOUNG FATHERS | 18:50 | PALCO HEINEKEN
Foi logo depois dos The Wombats que os Young Fathers começaram a tocar no palco Heineken. Donos de um estilo musical que mistura funk, hip-hop e eletrónica, os escoceses, que já venceram um Mercury Prize para melhor álbum do ano do Reino Unido, não deixaram o crédito por mãos alheias e deram um concerto cheio de garra. Em palco, os quatro elementos marcaram pontos e temas-single como “Rain or Shine” foram entoados por uma plateia já por si considerável. Foi assim, com muita percussão e beats à mistura, que se abriu o palco secundário do NOS Alive.
Era a primeira vez que James Bay tocava em Portugal. Mas tal não parecia dada a reação dos portugueses aos temas melancólicos do jovem britânico de 24 anos. Apenas com um álbum editado – Chaos and the Calm -, que faz lembrar, a espaços, artistas como Bruce Springsteen, Jeff Buckley e John Mayer, Bay deu um concerto coeso e seguro à frente de uma grande multidão.
“Craving” deu o pontapé de saída no concerto, seguindo-se temas como “When We Were on Fire” e “If You Ever Want to Be in Love”, com uma plateia atenta e que já acompanhava o show com muitas palmas. Com uma boa figura, o britânico Bay foi também agradecendo a todos os presentes num português muito aceitável, revelando-se surpreendido com tamanha reação dos portugueses à sua vinda ao NOS Alive. Nas suas canções encontramos sonoridades de indie rock alternativo e blues rock, mas também momentos de grande acalmia, como é o caso de “Move Together”. Curiosamente, e apesar do insistente airplay das rádios no tema de sempre, cantigas como “Best Fake Smile” ou “Let It Go” mostraram ser sucessos e facilmente reconhecidos pelo público. Claro que, para o grande final, ficaria a canção mais popular: “Hold Back The River”, cantada em uníssono pelos fãs. Boa estreia em Portugal, jovem Bay!
CAPITÃO FAUSTO | 20:00 | PALCO HEINEKEN
Em cima das oito da noite alguns festivaleiros mais distraídos correram para o palco Heineken mas não encontraram Jessie Ware. O concerto da cantora inglesa tinha sido cancelado no próprio dia, para desilusão de muitos. Em sua substituição avançaram prontamente os Capitão Fausto, que já ali tinham atuado há dois anos. Neste regresso imprevisto ao Alive trouxeram mais um trunfo de peso: "Pesar o Sol", o sucessor de "Gazela", revela mais maturidade e tem o epíteto de um dos melhores discos nacionais de 2014. E, de facto, temas como "Prefiro Que Não Concordem" e "Más Maneiras" foram das mais aplaudidas. Confiantes em palco, fizeram soar as guitarras bem alto (lamenta-se apenas a má qualidade do som, que muitas vezes tornou impercetível a voz de Wallenstein), num turbilhão psicadélico que até justificou crowdsurfing.
BEN HARPER & THE INNOCENT CRIMINALS | 20:40 | PALCO NOS
Ben Harper é um velho conhecido de Portugal e até do próprio Alive, onde atuou como cabeça de cartaz em 2008 com os irrepreensíveis The Innocent Criminals, com quem conquistou reconhecimento internacional. Curiosamente, nesse ano a banda abandonou os palcos e o regresso só se deu há poucos meses. Mas se a fórmula que o californiano nos apresentou é igual, o contexto está longe de ser o mesmo. A sua época de ouro passou inexoravelmente, tendo por isso sido óbvia a aposta na nostalgia, ao tocar maioritariamente temas dos seus primeiros álbuns, lançados na década de 90. Pouco comunicativo, Harper desdobrou-se por diversos estilos musicais (folk, blues soul, rock e reggae), passou pela guitarra acústica e sentou-se para tocar lap steel. Ouviram-se êxitos como "Diamonds on the Inside", "Steal my Kisses", "With my Own Two Hands" e "Amen Omen" mas, numa altura em que muita gente terá aproveitado para jantar, apenas as primeiras filas terão vibrado sem quebras de atenção durante o concerto.
METRONOMY | 21:25 | PALCO HEINEKEN
A avaliar pela enorme enchente que se registava no palco Heineken por volta das nove e meia, era percetível que o regresso dos Metronomy voltou a suscitar grande entusiasmo. Os britânicos têm sido presença assídua em Portugal, estando ainda bem frescos na memória os excelentes concertos que deram naquele mesmo palco em 2013 e no Super Bock, Super Rock do ano passado. A banda continua a revelar apurado sentido estético e desta vez o dress code foi azul (camisa e casaco) e branco (calças e sapatos). Eram cinco em palco mas as atenções fixaram-se invariavelmente no carisma da baterista Anna Prior, cujo sorriso rasgado foi diversas vezes motivo de destaque nos ecrãs gigantes.
Sempre com a audiência na mão, alternaram os temas mais mexidos do aclamado álbum "The English Riviera" (2011) com os mais introspetivos do recente "Love Letters". E também não faltaram coreografias: "I’m Aquarius" foi tocada com todos os músicos alinhados na retaguarda em estilo de coro, deixando lá na frente apenas o encaracolado Joseph Mount, sentado ao orgão. Houve sintetizadores dispostos na vertical, houve dança contagiante e canções com letras na ponta da língua, como em "The Look", "The Bay", "Love Letters", "Corinne", "Heartbreaker" e "She Wants" (estas duas últimas pontuadas por uma poderosa guitarra-baixo). E com o inédito "Old School" houve também um levantar de véu sobre o que está por vir. No final, uma certeza: tínhamos acabado de assistir a um dos melhores concertos da noite.
Os Alt-J também eram repetentes no Alive mas desta vez foram promovidos ao palco principal, tendo atuado precisamente antes dos Muse. E foi precisamente aí que residiu o fatal equívoco: o som lento e delicado que resulta do namoro entre instrumentos acústicos e as texturas eletrónicas exige recato e contemplação… mas isso era pedir demais a uma plateia demasiado claramente ansiosa pela chegada dos cabeças de cartaz da primeira noite. Tirando esse (grande) pormenor, o trio de Leeds (acompanhado por um guitarrista/baixista) deu um espetáculo bonito, sob um jogo de luzes grandioso mas intencionalmente contido.
A viagem noturna seguiu as coordenadas de "An Awesome Wave" (2012) e "This is All Love" (2014), os dois únicos álbuns editados. A princípio ainda conseguiram agarrar o público com temas mais mexidos ("Fitzpleasure", "Left Hand Free" e "Dissolve Me") mas depois abrandaram e acabaram por se perder na imensidão do palco NOS. Ainda assim, lá bem na frente, os fãs seguiram tudo com um sentimento muito próprio, muitas vezes com os olhos cerrados para melhor absorver a candura angelical de temas como "Matilda", "Tesselate" ou o litúrgico "The Ripe & Ruin". Despediram-se com juras de amor em "Breezeblocks" mas por essa altura a larga maioria dos presentes já estava numa órbita povoada por drones…
O momento pelo qual as 55 mil pessoas presentes no recinto esperavam estava prestes a chegar: os cavaleiros Muse iam entrar em palco. Ao redor, era bom notar que os outros palcos paravam para que toda a gente se pudesse concentrar num único concerto. Afinal, o objetivo era não repetir casos de outros anos, em que o nome maior do festival tocava e nos outros palcos haviam cerca de 300 pessoas.
Bem, vamos ao que interessa. Os Muse, que segundo Álvaro Covões já estavam garantidos para esta edição desde o fim do NOS Alive 2014, tinham como mote de visita ao nosso país o lançamento do mais recente álbum, Drones, que, segundo os próprios, é um “back to basics”. Não será bem assim, mas a verdade é que os britânicos deixaram o experimentalismo e a eletrónica de lado para regressarem ao que, em abono da verdade, funciona: um trio de rock poderoso e com uma série de hits prestes a serem servidos.
Foi precisamente “Psycho”, um dos singles do novo álbum, que iniciou a demanda no concerto. Um tema forte e que serviu de mote para um dos sons mais fortes do trio de Teignmouth, “Supermasive Black Hole”, que será a música preferida de muitos fãs mais recentes dos Muse. Com álbum novo já lançado, era de esperar que o concerto fosse algo baseado em Drones, que, apesar do nome, não se viu nenhum a filmar o concerto. Assim, foram servidos outros temas fortes como “The Handler”, “Dead Inside” – mais um hit do grupo – e “Reapers”. A verdade é que, apesar destes temas ainda não serem tão bem recebidos pelo público, funcionam bem ao vivo e mostram que têm lugar na setlist de um qualquer concerto dos Muse.
Mas o sucesso de uma banda faz-se também de história, tendo por isso havido incursões por álbuns como The 2nd Law, The Resistance, Black Holes and Revelations e Origin of Symmetry. Assim, temas como “Plug in Baby”, “Starlight”, “Hysteria”, “Time Is Running Out”, entre outros, fizeram as delícias dos fãs que acompanham esta banda britânica que já conta com 15 anos de atividade no currículo.
Já no encore, a bela da harmónica fazia adivinhar a explosão habitual de energia no épico “Knights of Cydonia”. Contas feitas, Drones funciona bem ao vivo, e a máquina demonstra estar bem oleada, mas achámos que desta vez ficou a faltar qualquer coisa. O espetáculo de luzes foi visualmente pobre e este também não foi o melhor concerto dos britânicos em terras lusas. Faltaram, por exemplo, temas como “Bliss”, “New Born” ou até mesmo uma “Citizen Erased”. Não obstante, são um trio com muitos êxitos para servir, pelo que, dificilmente, alguém terá saído desiludido de um dos seus concertos.
DJANGO DJANGO | 01:40 | PALCO HEINEKEN
Saímos de Muse diretamente para o palco Heineken, onde os também britânicos Django se preparavam para dar início à atuação. E o que dizer? Tal como há dois anos, a banda apelou à dança e transformou aquele espaço numa pista de discoteca gigante. Sim, é verdade que o novo álbum Born Under Saturn pode não ter causado tanto impacto como o homónimo Django mas, ao vivo os britânicos colocaram toda a gente a saltar num concerto non-stop que durou cerca de uma hora. É verdade que já não são tão frescos como em 2013, e muita gente abandonou o recinto após o concerto dos Muse (afinal o dia seguinte era dia de trabalho), mas a tenda Heineken estava cheia!
“Hail Bop” deu início ao concerto, mas logo aqui se percebeu que, hoje, os portugueses conhecem melhor os Django, acompanhando mais facilmente as letras das canções. Temas irresistíveis como “Storm”, desafiantes como “Waveforms” e robóticos como “Default” mostraram que, apesar da não promoção ao palco NOS, o som dos britânicos encheu as medidas do palco secundário de uma forma incrível. E o novo álbum não ficou esquecido: temas como “Shake & Tremble” e o single “First Light” foram bem recebidos pelos milhares que aguentaram até altas horas.
Mostrando resultarem de uma feliz junção de Beach Boys, Kraftwerk e Franz Ferdinand, deram a sua atuação por terminada com a explosiva “WOR”, que nos transporta para o universo western de Tarantino. No final, com o corpo completamente exausto, saímos com um sorriso nos lábios. Um concerto quente, tropical, completamente despido de preconceitos. Já eram três da manhã, mas que se lixe, estava aqui o melhor concerto do dia.
FLUME | 03:00 | PALCO HEINEKEN
Os mais resistentes ainda ficaram para ver Flume, produtor australiano cuja fama vai crescendo cada vez mais. Afinal, é da sua autoria o remix de “You & Me”, dos Disclosure, um dos cabeças de cartaz do festival. Nesta noite não houve Disclosure, mas houve canções de “Flume”, disco homónimo de 2012. De lá saíram temas como “Some Minds” e outros igualmente melancólicos. No final, e isto já eram 4h00, foi um concerto bem recebido e com muita gente. Era altura de ir para casa.
DIA 2 – 10 de JULHO | FOTOS
BLASTED MECHANISM | 18:00 | PALCO NOS
No palco NOS o dia começou logo a abrir com os portugueses Blasted Mechanism, que completam este ano 20 anos de existência. Valdiju, Guitshu e restantes membros são responsáveis por uma sonoridade pouco habitual, em que misturam o rock com muitos elementos da world music. Imaginativos nos temas e também nos próprios uniformes e cenários de palco, os Blasted vieram ao palco principal do Alive (onde já tinham estado em 2007) apresentar o mais recente álbum Egotronic. Aliás, foi mesmo com “Really Happen” que a festa começou, junto de um público só por si já bastante numeroso. Foi, no entanto, com temas mais antigos e ao longo de quase uma hora de concerto que se fez a festa. “Blasted Generation”, “Karkov (Nadabrovitchka) e, claro, “The Atom Bride Theme”, a fechar o alinhamento, encerraram uma atuação enérgica de uma banda que merecia muito mais reconhecimento no nosso país.
Foi um final de tarde muito pesado proporcionado pelos Marmozets, uma banda constituída praticamente por miúdos. Miúdos, mas com muito mais garra e força que outras bandas que conhecemos. Cremos que muitos terão ficado surpreendidos. Afinal, foi um rock nu metal que tanto incendiou alguns da plateia como incomodou outros tantos. Muita distorção, amplificadores ao mais alto nível, bateria irrequieta e uma vocalista que ia mudando o registo vocal conforme fosse preciso. Esta é fórmula dos Marzomets e funciona bem que se farta! Deviam ser poucos os fãs dos Marmozets, mas temas como “Hit The Wave” e “Captivate You” causaram mossa no público. Ah, e ainda houve tempo para uma cover de “Iron Man”, dos Black Sabbath. São novatos, mas estes ingleses prometem muito.
BLEACHERS | 19:50 | PALCO HEINEKEN
A estreia dos Bleachers em solo nacional fez-se num palco Heineken muito bem composto. Liderados pelo vigoroso vocalista Jack Antonoff (ex-namorado de Scarlett Johnason e membro dos Fun.), apresentaram praticamente na íntegra "Strange Desire", o seu único disco de originais, editado no ano passado. A synth-pop destes norte-americanos é banal mas bastante orelhuda, tendo os temas sido tocados de forma tão energética que acabaram por conquistar uma audiência desejosa de festa. A própria banda pareceu contagiada pelo ambiente, com Antonoff a atirar-se euforicamente para o chão por diversas vezes e com o saxofonista a trepar por um dos gradeamentos durante uma apresentação individual à maneira antiga, com direito a solo de cada um dos músicos. Para a frenética reta final guardaram "Go on Your Way" (um original dos Fleetwood Mac), "Rollercoster" e "I Wanna Get Better" e a despedida foi tão apoteótica que o vocalista acabou a distribuir setlists pelos que ocupavam as primeiras filas.
CAPICUA | 20:50 | PALCO CLUBBING
“Dia 10 não vamos mesmo facilitar!”, lia-se no Facebook oficial de Capicua uns dias antes do concerto. E a verdade é que, mesmo lesionada num pé, a rainha do hip-hop português cumpriu o prometido. O palco NOS Clubbing foi pequeno demais para albergar tantos interessados e a sua entrada em palco foi tão triunfal que a rapper teve que fazer um compasso de espera até que os gritos e as palmas abrandassem. Sempre apoiada pela voz da amiga Marta Bateira aka M7, pela programação de Virtus e pelo scratch de DJ D-One, entregou-se à poesia e à prosa em temas como "Mão Pesada", "Sereia Louca", "Medo do Medo", "Casa do Campo" e "Pedras na Calçada", este último contruído a partir de beats de Kanye West. Lá atrás no ecrã gigante, uma originalidade: o ilustrador Vítor Ferreira, também em palco, ia desenhando imagens digitais em tempo real, alusivas a cada um dos temas.
Para a interpretação de "Medusa" (tema que dá nome ao álbum de remixes editado este ano), contou com a participação especial de Valete, que apelou para que as aspirações maternas de Capicua não sejam motivo para o seu afastamento da cena musical. A rapper não deu tréguas ao poder político ("Jugular"), citou Sérgio Godinho para evocar o valor da liberdade e, já quase no fim, pôs todos a cantar o refrão de "Vayorken". E a gente divertiu-se imenso.
Ainda estamos para perceber como é que uma banda destas, com um êxito radiofónico de qualidade duvidosa, consegue chegar ao palco principal de um festival português. Sim, os Sheppard são a banda responsável por “Geronimo”, mas, tirando isso, ninguém está realmente interessado em saber o que fazem os elementos da banda em palco. Na prática, serve como música de fundo para meter a conversa em dia.
Convenhamos que, para alguns, estes australianos trouxeram alguma alegria, cor e todas essas coisas pirosas. Mas metê-los a tocar depois dos Marmozets, que quase destruíram o recinto, é puro suicídio. Apesar de singles como “Something’s Missing” e “Let Me Down Easy” terem sido escutados, estes estreantes passaram por despercebidos e, acreditamos, ninguém quis realmente saber deles.
THE TING TINGS | 22:10 | PALCO HEINEKEN
Os The Ting Tings estiveram no Alive em 2009, numa altura em que o álbum de estreia "We Started Nothing" os tinha acabado de catapultar para a fama. Volvidos seis anos, o duo de Manchester chegou ao palco Heineken com um novo longa duração, "Super Critical", co-produzido por Andy Taylor, antigo guitarrista dos Duran Duran. Porém, mais do que ter servido para apresentar o novo trabalho, o alinhamento seguiu um formato best of onde não faltaram "Great DJ", "Shut up and Let Me Go" e "That’s Not My Name".
De calções, boné e sempre com a guitarra na mão, a irrequieta Katie White não parou um segundo, enquanto o baterista Jules de Martino por vezes também deu atenção à guitarra. O duo fez-se acompanhar em palco pelo DJ Boix, que com scratch e samples foi emprestando uma sonoridade mais groovy ao espetáculo. "Wrong Club" e "Green Poison" foram as únicas amostras do novo álbum, ambas indisfarçavelmente inspiradas na guitarra funky de Nile Rodgers. Mais tarde, com os três músicos alinhados em frente à mesa de mistura, houve ainda tempo para uma breve incursão a "Letting the Days Go By", original dos Talking Heads. Sem complexos em celebrar o passado, o público foi na onda retro e nem pareceu importar-se muito com a fraca qualidade de um som que por vezes chegou a ser demasiado estridente.
MUMFORD & SONS | 22:20 | PALCO NOS
O que dizer de Mumford & Sons, eles que já foram tão felizes em Portugal? Bem, a história de amor já não é o que era. Esfriou. Já não existe aquela paixão de antes. O culpado? O mais recente álbum Wilder Mind fez com que a banda largasse o banjo. Resultado? Um tiro no escuro e um desinteresse dos fãs no mais recente registo de estúdio. O concerto não foi mau, longe disso, mas poderia ter sido bem melhor.
Foi, efetivamente, uma má decisão da banda. É sempre um risco lançar um álbum que vira o jogo quando um determinado artista ou banda está em estado de graça. Foi o que se viu com os Mumford. Apesar de terem a magnitude para preencher o palco NOS, a reação do público não foi tão efusiva como em concertos anteriores. E de notar que já tinham à sua frente milhares e milhares de pessoas. Nota-se que as novas canções, à exceção do single “Believe”, não entusiasmam e acabam por passar despercebidas. Afinal de contas, é a folk e o sacana do banjo que deram a conhecer os Mumford & Sons ao mundo. Com a viragem para a eletrónica, perde-se a essência, transformando-se em apenas mais uma banda entre tantas outras. Ao vivo, o coletivo continua a dar o melhor de si e o vocalista Marcus Mumford esforça-se ao máximo para que as novas canções funcionem.
Obviamente, no decorrer do espetáculo, foram os temas de Sigh No More e Babel que fizeram as delícias dos presentes. “I Will Wait”, despachada logo ao início, “The Cave” e “Little Lion Man” foram muito festejadas, notando-se que são estes temas que dão selo de qualidade ao grupo. Só esperemos que, entretanto, não se tornem numa sombra do que já foram. É que, por este andar, correm o risco de passar despercebidos. E aí perdem-se as salas esgotadas…
FUTURE ISLANDS| 23:30 | PALCO HEINEKEN
O regresso dos Future Islands a Lisboa era aguardado por muita gente, especialmente por aqueles que não conseguiram bilhete para os ver atuar no exíguo Musicbox no final do ano passado. Isso mesmo ficou comprovado pela casa cheia que a banda de Baltimore tinha à sua espera quando subiu ao palco Heineken. A razão de tamanho interesse reside em "Singles", refrescante álbum lançado em 2014 que faz jus ao nome e que quebrou um ciclo de três discos recebidos de forma pouco expressiva. Aliás, a incursão pelos temas mais antigos não se revelou particularmente entusiasmante, com exceção de "Balance", repescado ao álbum "On the Water" de 2011. Naturalmente, os melhores momentos da noite surgiram com os recentes "A Dream of You and Me", "Sun in the Morning", Doves", "Light House", "Spirit" e o obrigatório "Seasons (Waiting on You)", entoados por uma plateia rendida que demonstrou ter a matéria bem estudada.
Os sintetizadores são uma constante, a bateria é frenética e o baixo é senhorial mas há ainda um espetáculo à parte: o vocalista Samuel T. Herring é um verdadeiro contorcionista, dançando com um arquear de pernas que faz lembrar Elvis e rodopiando em contantes agachamentos, mais adequados numa aula de ginásio. Por vezes vocifera com tanta ferocidade que parece estar a rosnar. Com uma energia alucinante, chega a ter ar professoral quando se ajoelha na extremidade do palco e, de dedo em riste, canta olhos nos olhos para alguns dos presentes na primeira fila. A expressão “animal de palco” nunca terá sido tão ajustada. Triunfaram, claro está, e ainda tiveram tempo para oferecer "The Chase", um primeiro avanço do novo álbum que será editado em breve.
THE PRODIGY | 00:30 | PALCO NOS
No segundo dia do festival, a programação esteve uma grande salganhada. Uma mistura de estilos leves e pesados que acabam por confundir muita gente. Em abono da verdade, foram os cabeças de cartaz, os The Prodigy, que melhor acabaram por tirar partido da situação, transformando o recinto numa pista de rave gigante.
Liderados por Keith Flint e Maxim – caminham a passos largos para os 50 anos de idade! -, os The Prodigy dão sempre concertos imparáveis em terras lusas. Aqui não há lugar para tempos mortos; é acender o rastilho e deixar arder. Foram muitas coisas a acontecer ao mesmo tempo – luzes fortes, MCs de um lado para o outro furiosos com o mundo, sintetizadores, bateria e guitarras. O público, ou melhor, a “Prodigy people”, nunca se cansou: tudo aos saltos, tudo a dançar, muitos a fazerem mosh. Pena o som não ter estado suficientemente alto, porque era o que se impunha num concerto deste gabarito. Aliás, aqui não se pensa muito. Pede-se força e potência, e a festa faz-se. Neste caso, foi “Breathe” que iniciou a loucura, deixando depois espaço para “Nasty”, “Omen” e “Firestarter”.
O som, esse, só começava a ficar mais audível em “Voodoo People”. Maldito técnico de som. Também não faltaram hits como “Invaders Must Die” ou “Smack My Bitch Up”. Já no final do encore, qual mais?, “Take Me To The Hospital” fechava uma grande atuação, que só pecou pelo som em má qualidade. São veteranos, marcaram os anos 90 e ainda hoje têm importância no mundo. São os The Prodigy, minha gente, e prometem continuar a sua demanda na libertação de adrenalina.
JAMES BLAKE| 01:00 | PALCO HEINEKEN
O jovem James Blake é já um nosso velho conhecido e aos poucos tem sabido conquistar um público fiel. Quando, à passagem da uma da manhã, o britânico entrou em cena no palco Heineken, já os The Prodigy ditavam leis no palco principal. Mas nem isso lhe retirou audiência, já que foi recebido por uma autêntica multidão de devotos da sua eletrónica tranquila e intimista, feita de camadas sonoras graves. Sentado em frente ao órgão, esteve acompanhado por Ben Assiter (bateria) e Rob McAndrews (guitarra/sampler) num cenário minimalista.
Curiosamente, o alinhamento escolhido respeitou quase sempre uma ordem cronológica. Arrancou com "Air & Lack Thereof", o single que o deu a conhecer ao mundo em 2009 e seguiu-se "CMYK" do EP de 2010. Só depois chegaríamos ao aclamado álbum de estreia lançado em 2011, para revisitar quatro temas, com destaque para "I Never Learnt to Share" e "Limit to Your Love", conhecida versão da canção de Feist, que mereceu coro afinado e uma das maiores ovações da noite. De fora ficou a bela "A Case of You". A meio do espetáculo a agulha mudou para "Overgrown", o seu último longa duração, de onde repescou "Life Round Here", "Digital Lion", o hipnótico "Voyeur" e "Retrograde". Pelo meio já tinha dado a conhecer "Radio Silence", primeiro avanço do novo álbum que será lançado durante o presente ano. E quando avisou que vinha aí a última música (a quase sussurrada "The Wilhelm Scream", pontuada pela guitarra distorcida), a reação a contragosto de uma plateia inebriada por aquele ambiente crepuscular, fê-lo prometer novo regresso. Depois de cinco presenças em festivais portugueses, fica a dúvida se o próximo espetáculo em solo luso será finalmente em nome próprio.
RÓISÍN MURPHY | 02:45 | PALCO HEINEKEN
Estranho concerto, o de Róisín Murphy. Pensavam que se iriam escutar hits dos Moloko? Pois desenganem-se. A eterna voz dos Moloko fez o que bem lhe apeteceu em palco, o que causou alguma indiferença no público. Hairless Toys, o seu último disco, é mais lento e pessoal que os anteriores, e isso também não ajudou ao ambiente do concerto. Apesar da elevada sensualidade (perdemos a conta das vezes que mudou de indumentária para encarnar diversos personagens) e da voz carismática, Murphy deu um concerto que seria muito mais apropriado para uma sala fechada. Tudo com muita qualidade, é certo, e é de se tirar o chapéu aos restantes músicos da banda, mas já eram 3h da manhã e ninguém queria um concerto mortiço. Alguns acharam brilhante, outros optaram por ir para casa descansar.
DIA 3 – 11 de JULHO | FOTOS
Último dia do festival e, como é habitual, mais uma banda portuguesa a abrir as hostilidades. Desta vez a tarefa coube aos HMB, um dos maiores fenómenos da Soul e Rn’B nacional, que ao longo de uma hora, mostraram todo o groove que os caracteriza. A verdade é que muitos fãs não perderam pitada e resolveram dançar e escutar com atenção o concerto destes tugas.
COUNTING CROWS | 19:30 | PALCO NOS
Terá sido o peso de uma carreira com quase 25 anos a justificar a presença dos Counting Crows no palco principal do NOS Alive’15? Não sabemos, mas a verdade é que a atuação dos californianos (sete músicos em palco) não arrancou mais do que uma reação morna de uma plateia ainda a meio gás. “Round here we all look the same” canta Adam Duritz no tema de abertura. Não sendo verdade, porque a passagem do tempo deixa sempre marcas, pelo menos é notório que o vocalista mantém intacta a sua farta cabeleira de rastas. De "Somewhere Under Wonderland", o mais recente álbum de estúdio editado no final do ano passado, apenas deram a conhecer "Scarecrow" e "Parisades Park", perante uma indiferença generalizada. Quando puxaram de clássicos como "Mr. Jones" e a conhecida versão de "Big Yellow Taxi" ainda se viu o balancear dos mais revivalistas, mas sem chegar a aquecer verdadeiramente o ambiente. Fecharam com "Accidentaly in Love", tema do filme "Shrek 2", sem deixar grandes saudades.
DEAD COMBO | 19:40 | PALCO HEINEKEN
Não é por serem portugueses, mas os Dead Combo deram um excelente concerto no palco Heineken. Têm material para isso e podem escolher várias músicas do seu repertório que o resultado final será sempre o mesmo: um concerto inesquecível.
Tó Trips e Pedro Gonçalves, aqui acompanhados por Sérgio Nascimento e Isaac Achega, ambos na percussão, deram um concerto musculado, muito celebrado, em regime de best of, até porque a curta duração do espetáculo assim o obrigava. Se em disco a bateria não existe, ao vivo a dupla percussão impõe mais ritmo, mais dinâmica, mais impulso. Para o final, ficou guardado o tema “Zorba, do compositor Mikis Theodorakis, ao mesmo que nos ecrãs surgiu a bandeira da Grécia a esvoaçar. O duo português continua em estado de graça, chegando a cada vez mais gente. Certamente que irão deixar bem patente o seu lugar na música portuguesa.
Tem apenas 23 anos, mas parece que já faz isto há imenso tempo. Falamos, claro, de Sam Smith, o menino bonito da pop britânica que tem conquistado tudo e todos. Recentemente, o cantor foi operado às cordas vocais devido ao uso excessivo das mesmas. Temeu-se o pior, mas Smith não cancelou o concerto. E ainda bem. Um dos melhores do festival, uma aposta segura e que, à partida, estava ganha. Afinal, a promoção ao palco NOS foi mais que justificada.
O aclamado In The Lonely Hour foi, claro está, o responsável pelo concerto do passado sábado. Estava muita, mas mesmo muita gente a assistir ao desfile de êxitos românticos e melancólicos de um homem que, nas palavras do próprio, só começou a ter sucesso e a ser realmente feliz quando começou a escrever sobre si próprio e tudo em seu redor.
Certamente que isso também ajudou a criar um bom concerto. Tal como a sua comunicação com o público, o seu carisma, a sua voz intacta e, claro, o suporte dos músicos que o acompanharam. Tudo junto e tivemos um espetáculo capaz de agradar às massas. “I’m Not The Only One” foi servida logo ao início, enquanto muita gente ainda corria desenfreadamente para o palco. Também se ouviram “Money on My Mind”, “Stay With Me” (celebrada a tal ponto que levou o jovem às lagrimas) e temas de outros artistas como “Tears Dry On Their Own”, da malograda Amy Winehouse, ou mesmo passagens por “Le Freak (Freak Out)”, dos Chic, e “Ain’t No Mountain High Enough”. A verdade é que o jovem Sam Smith sabe o que faz. Encanta com a sua voz, mas também fala muito com o público, quase como se este fosse o seu melhor amigo. E é disso que a malta nova gosta, gente que não tem papas na língua.
MOGWAI | 21:10 | PALCO HEINEKEN
O concerto dos Mogwai foi simplesmente avassalador, tal como aliás já tinha sido na sua passagem pelo NOS Primavera Sound no ano passado. A banda escocesa celebra este ano vinte anos de carreira e o seu vasto catálogo permitiu-lhes apresentar um alinhamento diversificado, com revisitações a trabalhos antigos e outros mais recentes. O palco Heineken foi demasiado pequeno para receber tantos sequiosos por viver a experiência cósmica que o quinteto de Glasgow normalmente proporciona. A meio do concerto, vislumbrava-se muito headbanging mas também muita gente siderada e contemplativa perante a autêntica tempestade de pós-rock que se abatia sobre todos os presentes.
As guitarras foram sem sombra de dúvida as principais protagonistas, não estivessem logo quatro em palco. Ao longo de quase uma hora ouvimo-las a ditar leis, a partir de distorções, riffs e feedbacks contínuos. Mas ainda houve espaço para outros intervenientes: o piano no início de "I’m Jim Morrisson, I’m Dead", os sintetizadores em "Mexican Grand Prix" e "Remurdered", o violino em "Hunted by a Freak" (um dos momentos da noite), a bateria furiosa em "Rano Pano" e "Batcat" e até a voz, que apenas se fez ouvir em "Teenage Exorcists". No final de uma verdadeira montanha-russa de emoções, sentimo-nos completamente cilindrados com tão impiedosa descarga elétrica, simultaneamente ruidosa e melódica, capaz de fazer sangrar ouvidos e depois deixá-los apaziguados, em ponto de rebuçado.
THE JESUS AND MARY CHAIN | 22:35 | PALCO HEINEKEN
O palco Heineken manteve-se sob o signo das guitarras pesadas da Escócia com a chegada dos The Jesus and Mary Chain. Ao fundo, a imagem da capa de "Psychocandy" denunciava um concerto diferente do normal. A banda encontra-se em plena tour comemorativa do 30.º aniversário do seu álbum-charneira. Existem poucos álbuns que atingem um estatuto de culto que faz com que mais tarde sejam tocados ao vivo na íntegra. O público português voltou a ter esse privilégio, depois no mês passado Patti Smith ter interpretado o mítico "Horses" no NOS Primavera Sound. Eram cinco em palco mas as atenções fixaram-se invariavelmente nos irmãos Reid. Estão mais velhos mas as rugas do tempo só terão sido notadas nas primeiras filas, por força de uma cortina de fumo contínua e de um denso jogo de luzes, bem como pelo facto de os ecrãs gigantes laterais terem permanecido desligados.
Rezam as crónicas que o seu último concerto em Portugal (em 2007, o ano em que se voltaram a reunir) deixou péssimas memórias, tendo-se assistido a uma banda desarticulada e desmotivada. Desta vez, porém, os piores cenários foram afastados por uma atuação competente que fez com que a plateia mais veterana do Nos Alive’15 revivesse os bons velhos tempos. E, pasme-se, até vimos Jim Reid dirigir-se ao público por duas vezes, ainda que de forma muito breve. Como os temas foram tocados exatamente pela ordem do disco, tivemos "Just Like Honey" logo a abrir e… soube-nos a mel. Houve mais momentos doces em "Taste the Floor" e "Sowing Seeds" mas na maior parte do tempo impuseram-se sobretudo as distorções das guitarras (no Twitter, Barry Burns considerou que os Jesus and Mary Chain fizeram mais barulho que os seus Mogwai). E como após o desfile dos catorze clássicos de "Psychocandy" ainda sobrava algum tempo, ofereceram três extras: "Head On", "Some Candy Talking" (outro dos momentos da noite), fechando com a polémica "Reverence", durante a qual ouvimos Jim Reid a afirmar “''I wanna die just like Jesus Christ… I wanna die just like JFK. Depois deste concertaço, e com um novo álbum na forja, resta-nos desejar longa vida aos grandes Jesus and Mary Chain.
CHET FAKER | 23:00 | PALCO NOS
Seguidamente no palco NOS, a contratação de última hora Chet Faker (substituindo Stromae) deu um concerto eficiente q.b. para todos aqueles que não tiveram oportunidade de o ver no Coliseu de Lisboa na semana anterior. Sim, estivemos presentes nesse concerto e, em bom abono da verdade, foi muito superior ao que se viu no NOS Alive. A explicação é simples: a música do australiano não funciona bem em espaços tão grandes. É uma eletrónica para ser absorvida lentamente e, sejamos sinceros, até o concerto do ano passado no palco Heineken foi superior ao desta edição do Alive.
Tal como Sam Smith, Chet Faker apenas conta no currículo com um álbum – Built On Glass -, tendo sido o suficiente para se transformar num super fenómeno em Portugal. Afinal, em poucos dias teve direito a uma noite de warm-up no Lux, dois concertos esgotados no Coliseu a ao palco principal do Alive. Porém, tal como diz a sabedoria popular, “o que é demais enjoa”.
Apesar de muita gente se ter deixado levar pelo universo eletrónico de Faker, onde se incluem malhas como “No Diggity”, “I’m Into You”, “Gold”, “Talk is Cheap” ou “1998”, este não foi um concerto muito inspirado. O ambiente não correspondeu às expetativas. “Faltou qualquer coisa”, disseram-nos. “Foi tão melhor no Coliseu”, asseguraram outros fãs. Nós, claro, concordamos, até porque não era altura indicada para o australiano estar no Alive. Obviamente que o mérito está todo lá: é um músico com talento e com uma boa voz, mas sem capacidade para controlar grandes espaços. Deixamos um conselho: ponham a sua música ao final da tarde, ao pôr-do-sol, e vão ver que não querem outra coisa. É aí que encaixa a música de Chet Faker.
AZAELIA BANKS | 00:05 | PALCO HEINEKEN
À passagem da meia-noite, queimaram-se os últimos cartuxos com a festa rija de Azaelia Banks. O palco Heineken encheu-se de devotos que a receberam em êxtase. Vestida com uma espécie de fato-macaco (bem menos ousado do que o vestido decotado com que se apresentou no Super Bock Super Rock em 2014), de cruz ao peito e brincos com argolas largas, a cantora nascida no Harlem fez-se acompanhar de um DJ e, ocasionalmente, por dois dançarinos que convidaram à dança com as suas coreografias. O concerto serviu para a apresentação do seu primeiro longa-duração que, após sucessivos adiamentos, foi editado no final do ano passado com um título muito original: "Broke with Expensive Taste".
Arrancou com "Yung Rapunxel" proclamando “I wanna be free”, de megafone em riste. Enveredou pelos ritmos latinos em "Gimme a Chance" (enquanto na plateia se erguia o sugestivo cartaz “Azaelia, marry me, I’ll teach you spanish”), usou de língua viperina numa "BBD" impregnada de insinuações sexuais, espalhou charme e esvoaçou entre o R&B e o hip-hop, ao ritmo das duas ventoinhas colocadas na extremidade do palco. Despediu-se em apoteose com "212" (a música que há uns anos a tirou definitivamente da obscuridade e que já chegou aos 40 milhões de streamings no Spotify), com a plateia aos saltos e de braços no ar, a entoar efusivamente o refrão “This shit been mine, mine!”. E foi mesmo tudo dela… e daqueles que fizeram a festa com ela.
Coube aos Disclosure a responsabilidade de encerrar o palco principal do NOS Alive’15. E o que se pode dizer é que o dueto britânico justificou plenamente a escolha, provando que está talhado para as grandes ocasiões. Desafiando o adiantado da hora e o cansaço acumulado de três dias de festival, transformaram o recinto numa verdadeira pista de dança. Quem tenha acompanhado a sua evolução reconhece sem dificuldade que a máquina que os envolve cresceu exponencialmente. Em quantidade mas também em qualidade. O cenário foi grandioso (com uma tela de leds a cobrir toda a largura do palco NOS e onde foram sendo projetadas diversas imagens), o jogo de luzes foi magnífico e sofisticado, a multidão compareceu em peso e as canções foram o que já se sabia: autênticos hinos à dança. Tocando frente a frente e no topo de uma plataforma, cada um dos irmãos Lawrence dispunha de uma espécie de estação especial apetrechada com a mais variada maquinaria eletrónica e até uma mini-bateria. Em determinados temas, um dos irmãos foi repartindo atenções entre a manipulação dos botões digitais e a guitarra-baixo.
Estiveram longe de se cingir a "Settle", até ao momento o único álbum editado pela dupla e que os tem levado a esgotar salas por onde quer que passem. Com o lançamento do segundo álbum anunciado para setembro, não recearam incluir no alinhamento nada mais, nada menos do que cinco temas novos: "Jared", "Super Ego", "Bang That", "Holding On" e "Willing & Able", o último dos quais contou com a inesperada presença do ganês Kwabs. E talvez por causa dessa surpresa a desilusão tenha sido maior quando se despediram com a aclamada "Latch" sem que Sam Smith tivesse subido ao palco. Na ausência do autor de "Stay With Me", foi mesmo o público que acabou por tomar conta da canção numa enorme deambulação de corpos cansados mas plenamente satisfeitos.
CHROMEO | 03:00 | PALCO HEINEKEN
O concerto dos Chromeo, que funcionou como o encerramento do festival, foi na nossa opinião um dos melhores desta edição do NOS Alive. A pouca energia que restava no corpo foi gasta aqui, a dançar sem parar, ao som do duo canadiano-americano de electrofunk, que fez de tudo para compensar o cancelamento do concerto numa edição anterior.
Fazendo lembrar uma mistura entre os Chic, Daft Punk e Duran Duran, os Chromeo puseram logo o público a dançar com “Night By Night”. Há quem chame a Dave 1 e a P-Thug os lordes do funk e, na verdade, parecem fazê-lo melhor que ninguém. Na prática, demonstram que a música está sempre aberta para novos caminhos, mesmo que isso implique reconstruir estilos de música, algo que está tão na moda hoje em dia.
Sempre interativos e animados, os Chromeo podem dizer que tiveram o Alive a seus pés, e bem que podiam voltar para um concerto em nome próprio. Nós íamos ver. E certamente que as meninas nas cavalitas dos homens, prontas para dançarem “Jealous (I Ain’t With It)” também não faltariam à chamada.
Em resumo, pareceu-nos que o NOS Alive’15 acabou por ser mais fraco que edições anteriores. Um cartaz não tão forte, alguns cancelamentos de última hora, várias desilusões, poucas surpresas e algumas boas confirmações. Mesmo assim, passaram 155 mil pessoas pelo Passeio Marítimo de Algés (dos quais cerca de 15 mil estrangeiros), num festival que voltou a esgotar um dos dias e os passes gerais.
No próximo ano o NOS Alive celebrará dez anos de existência e o encontro já está marcado para os dias 7,8 e 9 de julho de 2016. Será esse o melhor cartaz de sempre? Lá estaremos para ver!
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quinta-feira, 16 julho 2015