Reportagem North Music Fest 2018
Foi com primavera cinzenta que o o Porto acolheu a 2ª edição do North Music Festival, numa celebração nostálgica que atraiu um pouco de toda a gente.
Houve um pouco de tudo neste festival bem nortenho desde propostas nacionais de topo misturas com projectos internacionais com bastante popularidade para as gerações que cresceram nos anos noventa.
E arrancou dia 25 de Maio com Da Chick, nome artístico da Teresa de Sousa, que apesar do pouco público espalhou a sua classe regada a funk, soul e hip hop. É sempre difícil ficar parado num concerto dela e este não foi excepção, apesar da desconfiança dos presentes em dar um pézinho da dança. Já brilhou mais noutros palcos, mas não foi por falta de esforço, agradecendo com simpatia o amor dado pela invicta.
Contudo, outros senhores se apresentavam: Linda Martini, banda grande que nunca perdeu a humildade de ser pequena, ligou o motor do rock mais sujo e noisy, mas sempre poético e belo. Com as novas músicas do álbum homónimo, lançado apenas em Outubro do ano passado, o quarteto lisboeta fez do que sabe melhor e deu um grande concerto, com um aumento notório de fãs a verificar-se em frente do palco. Apesar das novas excelentes canções, foram mesmo temas já clássicos como “Amor Combate” ou “Ratos” que mexeram mais com o público.
A maioria das pessoas viria mais decidido a aproveitar a viagem ao passado com a celebração do primeiro álbum dos germânicos Guano Apes, editada recentemente em disco na forma de Proud Like a God XX. Por isso mesmo esperava-se ouvir muitos temas que certamente foram banda sonora da adolescência de muitos trintões presentes. Temas como “Maria” ou “We Use The Pain”, passando pela mais sensível e sentimental “Rain” a actuação de Sandra Nasic e companhia foi também marcada por versões feitas a propósito da regravação mais recente, como “Lose Yourself” de Eminem (aqui numa versão mais rock que a original) ou, mais à frente no alinhamento, “Precious” da gigante banda inglesa Depeche Mode.
Mas foi sem supresa que temas como “Open Your Eyes”, a ouvirem-se a meio do concerto, ou a sequência final do encore com “Big in Japan” e “Lord of the Boards” que levou o público ao êxtase: afinal, foram estes que catapultaram e cimentaram a banda como uma referência do chamado rock alternativo dos anos noventa. Apesar das visíveis marcas da passagem do tempo nos rostos da banda e, sobretudo, na sonoridade que faz roupa às suas canções, é complicado resistir a sorrir e lembrar os tempos das Westpacks e da rara internet analógica..
Mas a noite ainda guardava trunfos na manga, e o namoro constante entre os portugueses e os americanos Gogol Bordello está vivo e de boa saúde. A banda que conquistou o povo português no verão de 2007 em Paredes de Coura e Sines voltou para a festa punk de sempre e é estranho pensar em como já passou mais de uma década desde o lançamento de Super Taranta, do mesmo ano.
E apesar da banda ter lançado verão passado “Seekers and Finders”, o que importa mesmo é a vitalidade e energia da trupe conduzida magistralmente por Eugene Hütz, e a chama, essa continua bem presente no circo montado pela banda. Porém, houve claro temas que se destacaram no repertório marcado pela fusão da folk balcânica com o anglo-saxónico punk rock, como o hino “Start Wearing Purple” e “Wonderlust King”. Foi por isso marcado por muitas camisolas suadas que os concertos do primeiro dia se despediram, com os mais valentes ainda irem espreitar Ermo e Xinobi para mais agitação electrónica.
O segundo dia começou com mais dois projectos nacionais bem distintos. First Breath After Coma trouxeram o seu rock bem próximo duns Explosions in the Sky ou Mogwai e são um dos grandes exemplos musicais de Leiria, que tanto têm dado ao panorama rock nacional.
Por seu turno, Slow J (nome de guerra do artista João Batista Coelho) veio representar as novas experiências e tendências nos campos do hip hop luso. O sadino têm-se destacado desde a edição independente do seu primeiro registo “The Free Food Tape”, de 2015, até o mais recente “The Art of Slowing Down”, do ano passado. E é de facto na arte de acelerar e desacelerar a batida, numa constante procura do que melhor serve a sua abordagem por vezes doce como no r’n’b, pesada como no rap ou perto do spoken word.
Se no dia anterior o festival viu subir a palco uma das últimas bandas rock a entrar num grupo restrito de vozes duma geração, os senhores de hoje já há muito que habitam no coração dos portuenses. Os bracarenses Mão Morta ainda não se cansaram de apresentar o seu brilhante espectáculo ao vivo de aniversário da edição dos Mutantes S21, que já leva uns gritantes 26 anos debaixo do braço. Acompanhado de diversas ilustrações projectadas no fundo do palco, compondo as narrativas macabras das canções, Adolfo Luxúria Canibal deu o usual espectáculo deambulante e povoado de loucura, calculada e, admitimos, ligeiramente repetitiva. Mas a execução é tão profissional nesta altura da sua carreira que é fácil deixarmo-nos levar nas ramblas de Barcelona ou saltar para um barco em Amesterdão. A juntar ao seminal alinhamento do Mutantes, que relembramos tem marcos do rock como “Budapeste” ou “Lisboa”, houve umas pérolas bem anteriores a essa albúm como “Velocidade Escaldante” ou “Bófia”. Um curto concerto, mas que certamente encheu as medidas dos fãs.
Para fechar a chave de ouro as actuações no palco, os britânicos The Prodigy aterraram a sua nave de drum and bass e big beat bem ao lado do edifício da Alfândega. Com um espectáculo de luzes, Flint e Maxim deram o litro para entreter as hostes, e a verdade é que conseguiram com relativa facilidade. É, de facto, um fenómeno de popularidade extenso a que a banda de Essex goza junto do público da Invicta, sendo daquelas projectos que consegue agradar tanto ao fã de EDM como o mais recesso roqueiro.
Foi sem meias medidas que a banda presenteou como arranque do concerto “Omen”, tema que os re-catapultou para o sucesso mainstream e onde é presença habitual em muitos sets de DJs de rock portuenses. Pouco depois, um regresso ao passado com “Everybody in the Place”, de “Experience” de 1992, ver chegar temas marcantes como “Firestarter” ou “Voodoo People”, que tantas presenças em mixtapes fizeram por Portugal fora.
Em ambiente de rave o festival precipitava-se para o seu final, onde temas como “Breathe” ou “Smack my Bitch Up” de Fat of The Land, sem esquecer a velhinha “Firestarter” brilharam, mas onde ainda houve tempo para repescar a nostálgica “No Good (Start the Dance)” no ínicio do encore, com um som bem mais inofensivo do que a descarga sonora que álbuns posteriores viriam a popularizar-se no som da banda.
Uma viagem entre o passado e o presente, uma actuação que espelha bem o que o festival acabou por proporcionar: um misto de experiências nostálgicas junto de bandas que já vimos imensas vezes, mas ao mesmo tempo beber do melhor que a música nacional nos tem para dar hoje. O tempo dirá se para o ano teremos mais, e foi escutando a muito longe Rich & Mendes que nos despedimos do North Music Festival.
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terça-feira, 05 junho 2018