Reportagem Optimus Alive! 2013 - Dia 13 de Julho
Alexandre Lopes
O segundo dia, provavelmente o mais coeso, do festival arrancou em peso a partir do momento em que Zachary Cole Smith, desta vez comandante dos DIIV, entrou em palco. Vindos de Nova Iorque, os americanos apresentaram pela primeira vez aos portugueses Oshin, editado o ano passado. Com uma sonoridade shoegaze, que nos obriga a fechar os olhos, sentir as vibrações dos instrumentos e mergulhar na introspecção e no comum cambalear para a frente e para trás, os DIIV (pronuncia-se “Dive” e deve-se à mente brilhante de Kurt Cobain a sua origem), para além de se apresentarem diversas vezes, tocarem segundo o alinhamento do álbum (com espaço para canções novas), pediram ainda para que algum farmacêutico devidamente identificado atirasse para o palco antibióticos para dar continuidade ao primeiro dos grandes concertos do dia.
Já o concerto tinha começado quando apanhámos a performance ao vivo dos Wild Belle. A banda, que tem todas as atenções postas na sua lindíssima vocalista Natalie Bergman – algo hiperativa e ansiosa em palco – apresenta um conjunto de canções bem dançantes e alegres que conseguem conquistar um público exigente. “It’s Too Late”, “Backslider” e “Love Like This” são bem conseguidas na voz reggae de Bergman, apoiada por uma competente banda.
O seu indie-rock solarengo, vindo do álbum de estreia Isles editado este ano, acaba por funcionar muito bem para um final de tarde. O tempo, tal como no dia anterior, teve um sol tímido, mas de tímidos os Wild Belle não têm nada.
Tom Krell não teve muita sorte com a sua estreia em Portugal. O som vindo do palco Optimus, gentilmente cedido pelos Jurassic 5, interferiu com a sua perfomance que tinha a possibilidade de ser algo memorável. How To Dress Well já editou dois álbuns, sendo o mais recente Total Loss, onde se destaca “Cold Nites”, a canção de abertura do concerto no palco Clubbing. Krell é um artista humilde e não tem qualquer problema em partilhar a ribalta com o seu colega, mas o azar toca a todos e o palco escolhido para o seu concerto não foi o melhor para realmente mostrar o poder que a sua música tem. Jurou a pés juntos, usando chinelos e meias brancas, que quer regressar a Portugal o mais depressa possível, tudo isto porque se apaixonou pela melancolia da cidade de Lisboa (e claro, pelos pastéis de nata)
Jurassic 5 foi uma aposta arriscada da organização. Nada fazia prever a entrada de uma banda de hip hop, num cartaz multifacetado, mas onde ainda assim não havia mais nenhum grupo do género. Uma jogada reticente, mas certeira e bem conseguida.
Este foi um grupo que teve em pleno silêncio desde 2007, altura em que se separaram, regressando apenas este ano ao activo. Os Jurassic 5 são constituídos por quatro MCs – Charlie 2na, Akil, Zaakir e Mark 7even – e por dois DJs – Dj Nu Mark e Cut Chemist – que trouxeram o seu hip hop dos anos 90 ao Passeio Marítimo de Algés.
Sabem como animar a malta. Nenhum dos elementos se interpela e, embora o público pareça desconhecer grande parte da obra do colectivo – clássicos como “Freedom” ou “Quality Control” sabem sempre bem – aderi-se em massa à actuação da banda. Puxaram imenso pelo público e sabiam sempre o que dizer.
A energia funk e groove destes senhores foi bem recebida, tendo os DJs mostrado serviço graças aos gira-discos. Foi um dos melhores concertos do dia e havia mesmo muita gente a dançar.
O sol estava a pôr-se e nada melhor para a actuação dos Rhye, projecto que une Mike Milosh a Robin Hannibal dos Quadron. Penumbra e uma voz sedutora, que para quem ouve é facilmente confundida com uma voz feminina, os Rhye, apesar de serem um dos nomes mais fortes do palco, pareceram deslocados e a desperdiçar potencial, à semelhança de Mazzy Star na edição de 2012, que apenas uma sala fechada lhes poderia proporcionar. Não questionando qualidade e potencial (porque têm), o público acompanhou a voz suave de Milosh ao longo de “The Fall”, a mais aplaudida e ideal para o final de tarde.
Foram uns Editors desengonçados e com vontade de mostrar serviço que passaram pelo Palco Optimus. Esta é daquelas bandas que não parece ter muita certeza do que anda a fazer: The Back Room de 2005 e An End Has a Start de 2007 foram certeiros, In This Light and on This Evening de 2009, álbum carregado (em demasia) de sintetizadores, foi uma viragem desastrosa da jornada musical do grupo, e volvidos quatro anos regressaram com o novo The Weight of Your Love editado este ano e que lhes recupera algum do prestígio.
A banda britânica já tinha visitado Portugal por várias vezes, regressando com novo material em mãos. A actuação começou com “Sugar” do novo registo, passando logo em seguida para temas bem mais conhecidos do público, como “Munich”, “An End Has a Start”, “The Racing Rats” ou “Smokers Outside the Hospital Doors”. O vocalista Tom Smith ia agradecendo – sempre em português – ainda que a reacção do público não fosse das mais entusiasmantes.
A banda tem qualidade, ninguém o nega, mas precisa de voltar a um registo mais parecido com as origens para não ser apenas mais uma banda que começa bem e depois cai a pique.
Ainda assim, foi precisamente “Papillon” do mal amado In This Light and on This Evening a música mais celebrada de todo o alinhamento. Numa versão arrastada, mas especialmente eufórica, os Editors acabaram o concerto em modo apoteótico, deixando todos com um sorriso nos lábios. Agora, venham daí os Depeche Mode.
Este seria o concerto, de entre os cabeças de cartaz, que seria o mais aguardado pelo público presente no Optimus Alive!. A mítica banda, que já conta com 33 anos de carreira, é o grupo de música eletrónica com mais sucesso na história da música.
É fácil descrever os membros da banda. Dave Gahan, vocalista, é um stripper demasiado bem pago. Teve problemas com drogas, sendo ainda acusado de vandalismo e de roubo de carros. A banda podia muito bem ter deixado de existir caso Gahan tivesse continuado nesta vida. Martin Gore, um dos fundadores da banda, é ele que escreve a maioria das músicas dos Depeche Mode e, se o grupo ainda existe, devemo-lo a ele, já que é o melhor amigo de Gahan, tendo-o salvo do mundo do alcoolismo e drogas. Quanto a Andy Fletcher, é o teclista e membro que passará mais despercebido.
A última vez que os Depeche Mode estiveram em Portugal foi em 2009, num esgotado Pavilhão Atlântico, depois da sua actuação no Super Bock Super Rock – na altura no Estádio do Bessa no Porto – ter sido cancelada, tendo apresentado Sounds of the Universe.
Nesta recente visita, tinham como pretexto apresentar o novo Delta Machines, editado em Março deste ano. Ao entrarem em palco, o colectivo começou por apresentar “Welcome to My World” do novo registo que, ao vivo, soa muitíssimo bem. Seguiu-se “Angel”, mas foi com “Walking in My Shoes” que o público começou a acordar. “Precious” do álbum Playing The Angel de 2005 foi outra cartada forte, reconhecido desde o primeiro acorde.
Por esta altura já percebíamos o quanto oleados estavam os Depeche Mode. A máquina funciona bem, muito bem até, e todos os elementos da banda se entendem na perfeição. Apesar de todos estarem acima da casa dos 50 anos, conseguem fazer um concerto capaz de agradar às massas. Martin Gore - discreto mas sublime nos solos -, Andy Fletcher – puxou pelo público várias vezes – e claro, Dave Gahan, que dançava que nem um louco, fazendo pose para as objetivas, movia a anca, e rodopiava vezes sem conta. É um animal de palco, que puxou pela voz do público inúmeras vezes.
O público português contou com uma surpresa: “Shake the Disease”, música tocada ao vivo pela primeira vez nesta digressão e cantada por Martin Gore, numa versão acústica. Já perto do final do concerto – antes do encore – ouviram-se os épico “Enjoy the Silence” e “Personal Jesus”. Fácil de adivinhar que foram os temas mais aplaudidos, mais celebrados e mais entoados até então.
A despedida, claro, soou a falsa, tendo o grupo regressado para mais alguns temas. Ouviu-se logo “Home”, novamente na voz de Gore, “Just Can’t Get Enough” que levou o público a um delírio total, tendo o concerto terminado com “Never Let Me Down Again”, música brilhante que levou todo o público a elevar as mãos, uma última vez.
Desta vez tinha mesmo acabado. Foram muitas as pessoas mais velhas que se deslocaram ao Passeio Marítimo de Algés só para ver a performance da banda britânica em Portugal. Um belo concerto, que mais tarde se viria a revelar o melhor entre os três cabeças de cartaz do festival.
Passaram, entretanto, pelo palco Heineken os Capitão Fausto e Jamie Liddel mas é Paulo Furtado que os portugueses querem. O já The Legendary Tigerman tem uma vasta legião de fãs e isso nota-se a partir do momento em que o palco Heineken já não consegue albergar vivalma. “Quem é que gosta de rock ‘n roll?” é a pergunta da praxe que é rapidamente respondida com entusiasmo. One man band, como o próprio se orgulha de afirmar, Tigerman contou com duas mãos preciosas de Paulo Segadães (baterista dos The Vicious 5 e guitarrista de X-Acto e da fase terminal dos Men Eater) numa canção, deu-se um pé de dança ao som de “Radio & TV” e Paulo Furtado, finalmente, mencionou e levantou parte do segredo sobre que está para vir no sucessor de Femina. Impossível não referir a participação (não presencial) de Lisa Kekaula, dos The Bellrays, durante “The Saddest Thing To Say” que deu início ao fim de um concerto que se junta a muitos outros já vistos, sem nada mais a acrescentar.
A encerrar o palco principal do segundo dia do Optimus Alive estiveram os belgas 2ManyDjs, em formato DJ set. Apesar da debandada ter sido geral após o fim da actuação dos Depeche Mode, muitos foram os que celebraram as remisturas que o duo passava. Ouviu-se “Get Lucky” dos Daft Punk, assim como Blur e Nirvana, passando para momentos mais metaleiros com remisturas de Sepultura e Motörhead. Um final de noite electrizante, e nostálgico, ao mesmo tempo.
O cancelamento de véspera das suecas Icona Pop deixou muitos dos presentes desapontados. Houve quem ainda esperasse pelo duo no palco secundário, até subitamente entrarem 3 homens em palco, encarregues de preencher a segunda vaga do festival. Hercules & Love Affair, o projecto de Andrew Butler, aqui em formato DJ set foi a contratação de última hora, para entreter o público que ansiosamente aguardava por Alice Glass e Ethan Kath dos Crystal Castles. House e disco cantado por dois artistas que fizeram questão de acompanhar Butler ao longo da sua actuação, onde tanto houve voguing como danças sem qualquer tipo de pudor, mas foi insuficiente para convencer o público a dançar como se ninguém estivesse a ver.
Oito são os concertos que os Crystal Castles já deram em Portugal e nunca são demais. Alice Glass, sempre explosiva e pronta para atacar apresentava um sorriso contagiante, algo raro e que se tem perdido ao longo das já incontáveis actuações à volta do globo. Depois dos concertos que estiveram longe de ser memoráveis no Hard Club, no Porto, e no TMN Ao Vivo, em Lisboa, foi no Optimus Alive! que os canadianos tiveram a possibilidade de compensar aquilo que deixaram por fazer.
São as sirenes de “Plague”, faixa de abertura de (III), que dão o sinal de partida para o cenário de guerra ainda para vir. Houve, porém, tempo para reviver o passado: “Baptism”, faz logo um convite ao público para sustentar Glass enquanto navega pelo mar de pessoas que tanto a deseja. “Don’t let anyone take advantage of you” balbucia Alice antes de saltar novamente para o público durante “Black Panther”, uma canção que fala sobre abuso sexual. Ethan Kath, sempre muito contido por detrás dos seus comandos e em sintonia com Christopher Chartrand, o baterista, espontaneamente puxava pelo sedento público.
Só quem é cego (ou quem não é fã) é que não vê diferenças e as evoluções que os Crystal Castles sofreram ao longo de toda a sua carreira. Alice está mais adulta e as canções tornaram-se sombrias, detalhadas e viscerais, nunca perdendo a essência da contestação, enquanto as suas perfomances ao vivo cada vez mais impressionantes e intensas, valendo-lhes sem dúvida o título digno de cabeças de cartaz do palco Heineken.
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Organização:Everything is New
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sexta-feira, 22 novembro 2024