Reportagem Rock in Rio Lisboa - 27 a 29 de Maio 2016
O segundo conjunto de datas do festival que chega ao Parque da Bela Vista ano sim, ano não, apresentava-se pouco inspirado: a falta de cabeças-de-cartazes capazes de, à partida, cativar grandes públicos não deixava antever cenários particularmente promissores. Ainda assim, a adesão foi notória nos últimos dias, sendo destes que guardamos alguns dos melhores e piores momentos da 7ª edição do Rock in Rio Lisboa.
27 de Maio
No dia em que coube aos Hollywood Vampires (coletivo que lista Johnny Depp, Alice Cooper e Joe Perry como protagonistas) o término da noite no Palco Mundo, houve muito para ver durante o dia.
Os Glockenwise subiram ao Palco Vodafone pelas 18h diante de uma plateia considerável em número, mas pouco interessada. O rock alternativo pouco surpreendente da banda de Barcelos não terá sido de facto suficiente para prender a atenção dos que por ali se deixaram sentar durante alguns minutos. A chuva começaria a ameaçar e só os resistentes teimaram em permanecer para a atuação dos Metz. Eventualmente a escolha mais invulgar do cartaz do festival, foi realmente revitalizante experienciar um concerto assim no Parque da Bela Vista. Serviu como algo capaz de nos relembrar que estamos de facto num festival de música, um contexto que por natureza convida a uma energia e vitalidade características, ao invés de filas para stands publicitários. Porém, fora os fãs das primeiras filas, são poucos os presentes que demonstram conhecer o repertório dos Metz e as suas aventuras por territórios ora noise ora grunge.
Às 22h a Tenda Eletrónica iniciava atividade com o djset de John Player Special que ainda conseguiu entreter todos os que fugiam do rock ‘n’ rol estagnado dos Rival Sons que enfrentariam uma plateia de fãs de Korn diante do Palco Mundo. Escutava-se por aqui agora house, funk, scratch, citações de worldmusic num molde de techno sigiloso, sem medo do diálogo com elementos invulgares. Sendo dos poucos locais sem vento do Parque da Bela Vista, o conforto que assegura acaba por atrair muitos dos presentes que se acumulam na Tenda Eletrónica. Beatbombers – duo constituído por DJ Ride e Stereossauro – fizeram por exibir continuamente as suas aptidões de scratch e outras estridências, sobre bases de EDM e dubstep que foram trabalhando ao longo do set, com um dinamismo incomum nas transições de faixas.
23H10 e os Korn voltam mais uma vez a palco, depois de mais um problema técnico a nível de equipamento de som ter feito com que, pela segunda vez, uma das bandas que mais fez pela popularização do nu-metal ficasse sem som em palco. Depois de meia-hora de espera, a banda de Jonathan Davis regressava para relembrar o impacto de “Falling Away From Me” entre outras. Porém, o som voltou a falhar e os Korn acabam por abandonar definitivamente o palco, após um alinhamento de 6 canções.
A noite terminaria com o concerto dos Hollywood Vampire que fazem vida de estrada com um espetáculo assente em êxitos de bandas icónicas do rock dos anos 70. Desde The Who a The Doors, foram várias as memórias de uma época já consideravelmente distante, mas populares ao ponto de pôr tantos milhares de pessoas a cantar. Contudo, tornou-se evidente que a maioria dos presentes ali estava por curiosidade (“a banda do Johnny Depp”) e não por particular admiração – algo que com certeza terá tido impacto nas movimentações para a saída do recinto, bem mais cedo do que aconteceu nos restantes dias do festival.
28 de Maio
Condenado à partida pela previsão de chuva forte, o dia de sábado acabou por surpreender por ainda assim cativar uma multidão de perder de vista durante a atuação dos Maroon 5. Antes disso, o cenário foi bem diferente.
Quando pelas 20h os Real State subiam ao Palco Vodafone o cenário era realmente desolador: de baixo de uma chuva que tardou em cessar, a banda de Nova Jérsia recorria ao seu rock psicadélico de traço solarengo para convencer os pouco presentes que – para além dos mais acérrimos e fãs de mosh – pouco interesse demonstravam pelo que se passava em palco. Sabotando tanto este como o concerto dos D.A.M.A. no Palco Mundo, a movimentação de público tinha outras metas: todos e quaisquer stands e bancas publicitárias que tivesse um toldo suficiente amplo para servir de abrigo. Felizmente, pela altura em que Ivete Sangalo iniciou a sua atuação, a meteorologia deu tréguas para a prestação de uma banda irrepreensível tecnicamente. Sendo uma excelente líder de plateias, Ivete trouxe a palco energia suficiente para que o seu concerto – com tanto de aula de aeróbica como de trunfo de sambódromo – contagiasse o público com uma boa disposição até então rara neste dia cinzento. Recuperando várias canções da Banda Eva e Olodum, foi com a habitual “Sorte Grande” que a artista brasileira deu mais uma vez (e é recorrente no Rock in Rio Lisboa, todos sabemos) do seu poder enquanto performer capaz de arrebatar multidões.
Segundo a organização, terão estado presentes no Parque da Bela Vista cerca e 85 mil pessoas para o concerto dos Maroon 5 que, tendo início pouco depois da hora marcada, começou de forma pouco convincente. Se Adam Levine é cobiçado pelo sex appeal, a verdade é que a sua prestação vocal deixou bastante a desejar durante as primeiras canções do alinhamento. A partir da versão de “Stereo Hearts” original dos Gym Class Heroes, o panorama melhorou consideravelmente: apesar da ausência de “Misery” e “Makes me Wonder”, canções como “Moves like Jagger” e “She Will be Love” – ambas já no encore – servem para testemunhar em pleno o efeito de canções realmente apelativas. Com a plateia absolutamente dominada, os Maroon 5 terão dado um dos concertos mais concorridos desta edição do Rock in Rio Lisboa.
29 de Maio
Sob o signo do cancelamento da atuação de Ariana Grande – substituída por Ivete Sangalo, que apresentou um alinhamento bastante semelhante ao do dia anterior – os ânimos não se sentiam particularmente efusivos neste último dia de festival. A tarde incluiu ainda assim bons momentos no Palco Vodafone: com um electro-pop muito afável, Isaura demonstrou-se evidentemente grata pelos poucos presentes que assistiram ao seu concerto. Incluindo uma versão de Imogen Heap, a verdade é que o sentido melódico de Isaura pareceu adormecido demais para um público pouco conhecedor das suas canções. Por todo o recinto sentia-se um ambiente bem mais descontraído que no dia anterior, algo para o qual o sol forte terá certamente contribuído. B Fachada subiria a palco acompanhado pelo teclado e parafernália rítmica que o seguem desde “Criôlo”. Apelidada pelo próprio como “a canção mais Rock in Rio possível”, “Questões de Moral” (do disco para crianças editado em 2010) iniciou um concerto que – como é típico do Palco Vodafone – foi feito para uma plateia diminuta, ainda assim calorosa desta vez. Cheio de citações sarcásticas, o humor do cantautor serviu quase como instrumento musical próprio: “Não há público como o do Rock in Rio”, “Quase tão bom como Capitão Fausto” – esta última após uma falha de som que anulou por completo o som de palco. Sem microfones e em comunhão com o público, B Fachada levou a canção até ao final. “Cada Um” foi momento de rara beleza, e antes de terminar a actuação, “Só te falta ser mulher” ficou dedicada “às pessoas que veem novelas e não sabem o que estou aqui a fazer”. No mesmo palco, seguiram as Hinds que trouxeram para Lisboa a energia madrilena do seu rock dito alternativo, mas mais vital pela descontração que apresenta.
Ainda que pouco habitual para cabeça-de-cartaz e fecho de edição, a última actuação do Palco Mundo tomou a forma do (ultra-estilizado) djset de Avicci, figura que me muito contribuiu para a massificação da electronic dance music. Anunciada como uma das últimas actuações do produtor sueco, a verdade foi que a transformação do Parque da Bela Vista numa pista de dança aconteceu de forma bem mais espontânea do que se poderia antecipar, com a popularidade de faixas como “I Could be the one” e “Wake me Up” a manifestarem-se na dança energética de grande parte do público.
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sexta-feira, 22 novembro 2024