Reportagem SWR Barroselas Metalfest XXI
Já lá vão 21 edições no bolso do estimado SWR Metalfest, que faz vibrar a localidade de Barroselas. A meca dos sons extremos acontece em abril com águas mil. E apesar do frio de rachar, a resistência do guerreiro de aço que acampa sempre no mato é superior a qualquer capricho pelo conforto da caminha. Ao fim ao cabo os três dias do festival acabam por ser um escape perfeito da rotina pesada do dia-a-dia.
As hostilidades tinham sido abertas na SWR Arena fora do recinto, no entanto é na saudosa tenda, esse oásis que alberga o público da chuva, do frio e do mundo em geral que os australianos Départe nos brindavam com o seu post-black metal. Com um som algo embrulhado não deixaram de surpreender pelo ambiente pesado. Pouco depois no palco principal os Mortuary Drape pregavam o seu black metal teatral e melódico. Focando-se no último registo Spiritual Independence. E se caos é a palavra de ordem dentro das sonoridades mais extremas, os Hexis são a encarnação do mesmo. Um set curtinho mas to the point, feito de riffs dissonantes e strobes que não deram descanso transportando o ouvinte para um inferno muito pessoal destes dinamarqueses.
Os principais headliners do dia, tocando pela primeira vez em Portugal, os lendários Master's Hammer deram um espetáculo que certamente vai ficar na memória de fãs devotos. Sempre com o seu experimentalismo e gosto peculiar, os checos deixaram um bom gosto na boca. Seguiam-se os Teethgrinder que “deram o litro” e deslocaram a plateia num frenesim e mosh intensa. Juntando todos os ingredientes do grind, death e crust elevam a fasquia dentro do seu nicho.
Outra estreia completamente exclusiva, os americanos Exhorder brindaram os presentes com o clássico Slaughter in the Vatican e embora as coisas tenham começado numa nota menos positiva (tarola partiu-se logo a seguir ao 1º tema), o grupo veterano deu conta do recado e conseguiu eletrificar a plateia. Mas nada nos ia preparar para o vendaval que se seguia. Os noruegueses Obliteration com o seu death metal tempestuoso, cheio de raiva e carregado de atmosfera vil. Uma das surpresas do festival. E para fechar o primeiro dia restava apenas Mortiis, que dispensa apresentações. Com raízes no black metal norueguês, este projecto de dungeon synth ficou aquém do esperado. A mesma cadência de sempre de esgotar a paciência não impressionou a maioria do público, no entanto os fiéis lá ficaram e agradeceram o espetáculo singular.
28 Abril
O segundo dia fez-se de contrastes interessantes. Por um lado tínhamos os nacionais Necrobode na LOUD! Dungeon a fazer-se ecoar com o seu Metal Negro da Morte e de outro lado no palco principal os espanhóis Looking for an Answer a debitar o Dios Carne, uma epopeia de death/grind politicamente consciente.
Entretanto os monolíticos Process of Guilt voltaram a subir o palco do Barroselas. Desta vez com Black Earth o mais recente longa-duração do grupo eborense que visa explorar mais a fundo as sonoridades dissonantes do sludge com traços de doom. O rugir das guitarras retumbante e o ritmo de marcha de guerra iminente fez se ouvir enquanto o grupo destruía tudo à sua volta. Atuação brilhante como já seria de esperar. E por falar de acuações brilhantes. Igualmente estrondosos mas noutro espectro musical completamente à parte temos os suecos Nifelheim. Com uma entrada teatral e ao som de um órgão, não foi preciso esperar muito para o ambiente se rasgar em riffs diabólicos. A dupla Hellbutcher e Tyrant chegaram e mostraram o porquê de serem uns dos maiores embaixadores de black/thrash. Completamente maníacos e viciosos, contagiaram com energia o público que se mostrou recíproco. O concerto do festival, sem dúvida.
Ainda com os sentidos em alerta seguiu-se outro bailarico com os checos Malignant Tumour logo de rajada. Igualmente intenso e divertido, não deixou ninguém indiferente, tal era a veemência do grupo. Com toques “à la” Motörhead, a festa fez-se de riffs galopantes e pé no acelerador. Posto isto, os lendários Suffocation tomavam de assalto o palco principal com o seu brutal/death técnico. Veteranos desta sonoridade, não vieram para brincadeiras e certamente deram um concerto competente. Cheios de garra, conseguiram manter o público ocupado nas enormes mosh pits que se iam abrindo cada vez mais. Ao som do clássico Effigy of the Forgotten que resulta muitíssimo bem ao vivo (muito por culpa da qualidade dos músicos). Ficou claro que a engrenagem dos americanos está intacta e a funcionar devidamente. E nada melhor do que acabar a noite com uma boa disposição, a cargo dos Filii Nigrantium Infernalium e um Belathauzer muito falador. A hóstia foi nos oferecidos a boca. E claro que não íamos embora sem sentir a maquinaria dos Evil Invaders. Uma ode aos anos 80, viciante e com muita velocidade, não fica nada a dever aos grandes titãs do gênero, uma abordagem mais moderna e cristalina. Perfuraram todos os sentidos que ainda restavam com solos melódicos de intensidade incrível.
29 de Abril
Com as baterias carregadas para a rodada final, fomos brindados com a típica apresentação sombria dos Altarage. Donos de um som cavernoso, foram uns monstros no que toca a criar paredes sonoros complexas e sufocantes. De volta ao palco secundário, a masmorra que Irae povoaram, sentiu a descarga do seu black metal repugnante e simplista. Mas longe de ser uma coisa má, a palavra de ordem nesta atuação é integridade. Rumamos a bélgica de 1985, onde os Agathocles de Jan Frederickx desbravam caminhos do grindcore até os dias de hoje. Entre rajadas e erupções de malhas clássicas umas atrás das outras não faltou energias a estes pioneiros. Depois de levarmos esta porrada só restava ver os Suma limpar os restos dos corpos com a sua abordagem muito pessoal de um sludge/stoner doom. Ritmos compassados e riffs densos formaram uma parede de fumo eminente. Terminando a atuação com a Let the Churches Burn, um clássico no repertório dos suecos.
Mais que apropriado, seguiam-se os Carpathian Forest. Recentemente “reformulados”, não conseguiram porém surpreender muito pela positiva. Dando um concerto competente, ao leme o Nattefrost, que transpõe carácter e a típica presença de uma personagem dos anos 90. No entanto devido a talvez fraca setlist e uma atuação sem muita faísca ficou tudo muito á quem. Para compensar os Nekromantheon deram o “baile” da noite. Dos ventos noruegueses trouxeram thrash demoníaco e completamente louco na veia de uns conterrâneos Aura Noir. De intensidade nunca antes vista povoaram o palco e o recinto com um batimento cardíaco demente.
Os japoneses Church of Misery, obcecados com serial-killers tinham a tarefa de fechar o palco principal deste ano. E como um bom worship de Black Sabbath pede, fizeram um trabalho exímio. Capturaram toda aquela aura 70’s num som energético e por vezes bem meditativo. Solos e riffs pesadíssimos transbordavam dos amplificadores diretamente para os nossos ouvidos. Seguramente ninguém saiu defraudado depois desta tomada nipônica com travos de stoner/doom mais tradicional. E eis que no SWR Arena, por momentos esquecemos o frio que se fazia sentir as 3 da manhã. Com uns RDB sempre bem-dispostos a apresentar o seu trabalho mais recente “Era Matarruana”. Mas só para aqueles que ainda tinham andamento para tal, um brinde muito especial, de facto. Festa incrivelmente animada que parecia não querer acabar.
Como é sabido, o último dia tem sempre um sabor agridoce, representando o fim deste colossal festival. Quer seja pelo ambiente familiar que nos proporciona ou bandas míticas que por cá vão passando e tantas outras histórias pessoais que cada membro do público pode recitar na ponta da língua. Tal é o efeito da reunião anual chamada Steel Warriors' Rebellion.
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segunda-feira, 21 maio 2018