Reportagem Santa Maria Blues 2015
Quando ouvirem falar na capital do Blues portuguesa, esta é mesmo a referência à baía dos Anjos, na pequena ilha de Santa Maria – Açores. Pequena em dimensão geográfica mas enorme em dimensão cultural - é aqui que decorre anualmente o maior festival de Blues do país com bandas originárias de todo o globo.
Parece que manter o “rótulo” de “Capital do Blues em Portugal” seja uma tarefa difícil, mas felizmente este é um festival que todos os anos cresce cada vez mais devido ao trabalho da “Associação Escravos da Cadeinha” e da produção da “Trovas Soltas” - responsáveis pela organização deste evento que traz à ilha milhares de pessoas oriundas de vários países e das próprias outras oito ilhas açorianas e continente português.
Na sua 12ª edição neste fantástico recinto localizado a escassos metros do Oceano Atlântico, a organização optou, mais uma vez, por trazer dois nomes nacionais para o primeiro dia do festival na quinta feira, 16 de julho. A abrir a noite e a edição de 2015 do Santa Maria Blues, Bruno Walter & Friends. Oriundo da própria ilha de Santa Maria, Bruno reside há já alguns anos na ilha Terceira onde mantém um assíduo projeto musical com um cariz diversificado e com uma completa banda com guitarras, sopros, e até violino. Para o Blues, Bruno trouxe um reportório musical de adaptações próprias de músicas do género Blues internacional como a clássica Suzie Q dos Clearance Clear Water Revival e de outros temas originais em português e inglês. Com várias referências ao amor que tem pela sua terra natal, aos amigos que cá estão e os que já não estão entre nós, o primeiro concerto foi repleto de emoções, memórias e vivências aplicadas às suas “cantigas” – como nos referia Bruno Walter Ferreira.
Estamos ainda na quinta-feira e o recinto completa-se e muito bem! Após o concerto dos açorianos, segue-se em palco um dos nomes mais esperados da edição de 2015. Regressando ao Santa Maria Blues depois de ter vindo em 2009, Budda e o seu trio regressam para a celebração dos 10 anos de vida do “Budda Power Blues”. É claro que o regresso destes “rapazes” era já esperado desde o fantástico concerto de 2009 e, claro, desta vez a celebração foi ainda mais especial com a presença que tem vindo a ser assídua nos concertos e no mais recente projeto do trio com a aclamada figura nacional do Jazz e da World Music – Maria João.
Maria João traz ao Santa Maria Blues uma fantástica ligação com as suas raízes do trabalho de vocalista jazz com o Blues e as guitarradas do Budda Power Blues. Para Maria João também foi um regresso à ilha, depois de ter estado em 2003 na Maré de Agosto com Mário Laginha. Para a vocalista, e como refere na sua página oficial do Facebook: “que d-repeat: initial;">bom que é cantar com eles [Budda Power Blues] ainda por cima neste festival numa das ilhas mais bonitas dos Açores, toda verdinha e com uma organização super simpática e dedicada e carinhosa”. A completar a noite, uma bonita jam session que trouxe, a convite do trio nacional, Alvon Johnson ao palco, como introdução ao seu concerto que seria na noite seguinte.
É sexta-feira e o céu cinzento ameaça a segunda noite de Blues na ilha mais oriental dos Açores. Nada que umas suaves guitarradas não ajudem e afastem as nuvens da baía dos Anjos, completando um prolongar da noite com um bonito céu estrelado e muita boa música.
Antes dos concertos, boa comida é servida no restaurante do evento, outros petiscos e doces estão à venda e o recinto vai enchendo para acolher um primeiro concerto de muita energia! Da Bélgica, com um 1º lugar no Belgian Blues Challenge, e um 2º lugar no European Blues Challenge, Doghouse Sam & His Magnatones apresenta-se em palco com uma formação não muito habitual de 3 membros em palco alinhados na frente do palco – desde as guitarradas do Blues festivo de Doghouse Sam, à fantástica percussão do já considerado melhor baterista da Holanda, Franky Gomez, até ao fantástico trabalho e boa disposição em palco de Jack “Fire” o’Roonie no contrabaixo. Foi uma calorosa apresentação do segundo dia de festival, que seguiu noite dentro com um guitarrista de renome. Dos EUA, detentor de vários prémios em várias categorias internacionais como por exemplo “Entertainer of the Year Award” pela “International Music and Entertainment Association”: Alvon Johnson!
Alvon é considerado um dos mais emblemáticos “bluesman” do mundo e trouxe a Santa Maria uma peculiar demonstração das mais clássicas guitarradas do Blues norte americano e de uma voz sonante. Alvon traz a Santa Maria um fantástico concerto repleto de emoção e interligação com o público – onde os sorrisos, os gritos e os saltos não faltaram. Tocou entre o público, notando-se o carinho entre artista e os que atentamente o ouviam, e fez uma bonita e imprescindível homenagem que é de destacar ao já considerado “rei do Blues” no mundo, e que faleceu ainda este ano: BB King. “We’re gonna do a little something for Mr. BB King.” – dizia Alvon tirando o chapéu que se manteve durante o concerto todo até esse momento de homenagem. O público brindou ao rei e ouviu, entre outros, “Thrill is Gone”. A noite terminou mais uma vez com uma fantástica jam session que trouxe ao palco, por exemplo Doghouse Sam com a sua harmónica ou mesmo o violinista de Bruno Walter, “Doctor P”.
Sábado, 18 de julho, a organização traz mais uma vez ao festival uma presença feminina na guitarra. A abrir a última noite da edição 12 do Santa Maria Blues, Joanne Shaw Taylor. Do Reino Unido, Joanne é detentora de um prémio “Best British Female Vocalist”, pela British Blues Awards. Mas não é só pela voz que Joanne se destaca! Perfeita dominadora das cordas, Joanne Shaw Taylor sabe como fazer soar bem a guitarra… Toca desde os seus 7 anos e já foi referenciada no mundo da música por Dave Stewart dos Eurythimics, com quem já fez várias tours mundiais. Abrilhantou o palco do Santa Maria Blues, a abrir para a presença habitualmente mais esperada do Blues – a última de sábado. Mais uma vez dos EUA, Dwayne Dopsie e os Zydeco Hellraiser’s. Dwayne é um mestre do acordeão e de uma não habitual mas que se tornou fantástica fusão do estilo Zydeco com Funk, Soul e claro, o Blues num ritmo elevado, assistido pela “rub-board” tocada incansavelmente noite fora.
O público mostrou-se muito curioso mas com boas expetativas para um concerto que já se ouvia falar que seria de uma energia formidável e calorosa. Parece que o público saiu bastante satisfeito! Saltos, gritos em conformidade com a energia de Dwayne, e muita boa música através de um fantástico desempenho no acordeão, acompanhado por um grupo de elite com um fantástico soar de guitarra nas colinas dos Anjos por Shelton Sonnier ou dos solos de Reggie Smith, no saxofone. Dwayne encheu o palco por duas vezes com a malta que agradavelmente dançou e cantou ao som dos Zydeco Hellraiser’s, com presenças locais a mostrarem o que valem pela sua voz, brindou-nos também com a voz de Joanne Shaw Taylor que voltou a tocar guitarra para o público mariense e cantou em formato “dueto” com Dwayne. O energético acordeonista norte americano passou também entre o público várias vezes acompanhado pelo jovem Paul Lafleurna “washboard” ou “rub-board”, característica de um Blues mais tradicional. Este foi um concerto único e memorável que Dwayne nunca mais esquecerá, admitindo ter sentido uma energia única e um amor inexplicável transmitido pelo público do Santa Maria Blues. Durante as três noites, depois de todas as atuações, a organização optou por ter em palco, mais uma vez, a presença de três dj’s açorianos para cada uma das noites, mantendo o calor e a energia até ao sol nascer.
Mais um ano se passou, e o público e organização estão mais satisfeitos do que nunca. As atuações foram ao nível dos verdadeiros amantes de Blues que marcam anualmente este evento na agenda e mesmo aqueles que apenas gostam do ambiente de festa que se fez sentir mais do que nunca. O recinto estava ao nível das boas condições desejadas pelos festivaleiros e, tal como diziam algumas pessoas à saída no último dia, “a comida é boa, a música é boa, as pessoas são excelentes, que mais é que se pode pedir?”. Para 2016, o Santa Maria Blues regressa na sua 13ª edição, no sítio do costume – “A capital do Blues em Portugal”.
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domingo, 24 novembro 2024